Nem só de luta se constrói uma mulher que lidera e inspira

4 de abril de 2022 - 7h51

(Crédito: Yashnova Natasha/ Shuttersotck)

Quero começar o primeiro texto aqui no Women to Watch te propondo um exercício reflexivo. Quero que imagine uma mulher. Permita-se, em alguns momentos enquanto a descrevo, fechar os olhos e tentar enxergá-la no seu imaginário.

Pense numa mulher competente e habilidosa, que ao longo de sua trajetória profissional conseguiu resultados positivos à frente das diferentes equipes que liderou. Empreendedora, construiu de restaurante à uma empresa de comunicação.  Pense no rosto, nas roupas, na maneira como esta mulher se comporta. Construa a imagem dela em sua mente. É uma mulher elegante, adora moda, não sai de casa sem dedicar um tempo a se maquiar, a arrumar os cabelos.

Fez MBA na Fundação Getúlio Vargas, uma das principais instituições da América Latina. Estudou inglês na Europa e em 2018 venceu o primeiro reality show da TV brasileira a premiar equipes empreendedoras e, junto com outros quatro excelentes profissionais, esta mulher emplacou e assinou um produto inovador nas prateleiras da maior fábrica de chocolates finos do mundo.

Formada em jornalismo, é colunista de diferentes plataformas de conteúdo, apresentadora de um programa jornalístico na TV aberta brasileira que acaba de ser premiado, recebendo o Troféu Mulher Imprensa pela qualidade do conteúdo apresentado aos telespectadores. Ela é redatora, palestrante de eventos dedicados a mulheres líderes e empreendedoras. É, com frequência, convidada para entrevistas em veículos de comunicação para falar sobre liderança, trabalho em equipe, diversidade e gênero. Em 2021, foi apresentadora do podcast do Mercado Livre, maior e mais completo marketplace da América Latina.

Conseguiu construir a imagem desta mulher no seu imaginário? Visualizou seu perfil? Sua maneira de se vestir? Como você imaginou o cabelo? Caído sobre os ombros, longos, cacheados ou lisos? E os olhos? Qual a cor dos olhos dela? Eram claros?

Agora seja sincero consigo mesmo. Você imaginou que esta mulher fosse negra?

Neste exato momento te darei uma pausa para um respiro longo e profundo.

Provavelmente você pensou numa mulher branca. Pois bem, muito prazer, esta mulher sou eu, Cris Guterres, sua nova colunista do Women to Watch. Eu sou uma woman to watch.

Eu quis iniciar provocando uma reflexão. Como você imagina ser uma mulher bem sucedida? Qual é a cor da pele da mulher que você imagina estar associada ao poder e ao conhecimento? Certamente, vivendo no Brasil que reproduz em todas as escalas o racismo estrutural, você tem dificuldade de imaginar um cabelo crespo e um tom de pele negro nesta mulher. Pois bem, eu sou negra e sou mulher, mas, antes de tudo, sou humana.

Direito à humanidade é o alvo constante de uma luta que venho travando e que recebi de herança de meus ancestrais. Faço questão de me apresentar e contar todos os meus feitos nos lugares em que chego. A história dos negros deste país sempre foi contada por pessoas brancas que deturparam nossas vivências, romantizaram nosso sofrimento e deceparam nossos sonhos. Romper a barreira racial e me estabelecer no lugar onde eu quiser — esta é uma das minhas missões.

Com a escritora Alice Walker, aprendi o poder de minha fala, para que meu silêncio não se tornasse uma arma nas mãos de meu opressor. Por isso eu falo, por isso escrevo. Para que minha existência não seja silenciada e minha humanidade seja reconhecida. Para romper com um ciclo de violência que há séculos silencia mulheres, sobretudo mulheres negras e indígenas.

Estou aqui para provocar reflexões, propor discussões acerca das questões de gênero e de raça no ambiente corporativo e, também, para falar de coisas leves, de filhos, de amores, de sonhos, das bolsas que amamos, dos sapatos que desejamos. Pois nem só de luta se constrói uma mulher que lidera, inspira e conecta.