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Onde estão as pessoas com deficiência do Brasil?

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Opinião

Onde estão as pessoas com deficiência do Brasil?

Quem não é contabilizado também não é percebido. Mas nós existimos, apesar da cultura em favor da nossa inexistência


21 de fevereiro de 2024 - 15h13

(Crédito: Adobe Stock)

A qualidade dos dados é fundamental para que eles sejam a base de caminhos bem construídos. Não adianta ter bons insumos se eles são analisados de forma precária ou enviesada e, no caso dos dados das pessoas com deficiência, de forma capacitista. A inteligência na apreciação da informação é o grande diferencial. É preciso ter cuidado com interpretações tendenciosas, de acordo com o que se quer provar.

No cenário das pessoas com deficiência no Brasil, chama muito a atenção a discrepância entre alguns dados existentes sobre essa nossa população, o que só colabora com o aumento das barreiras para a inclusão. De acordo com levantamentos da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2011, há 1 bilhão de pessoas no mundo com alguma deficiência. No Brasil, o Censo de 2010 indicava mais de 45 milhões de brasileiros com deficiência, os quais correspondiam, na época, a 25% da população do país. 

Porém, em 2021, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), também coordenada pelo IBGE, apontou que 8,4% da população brasileira com idade acima de dois anos têm algum tipo de deficiência. Esse percentual nos leva a um contingente de 17,3 milhões de pessoas. Já em 2022, a PNAD divulgou que o Brasil tem 18,6 milhões de pessoas com deficiência. Ainda teremos os resultados sobre a população com deficiência no Censo de 2022, mas só devem ser divulgados no último trimestre deste ano, segundo o próprio IBGE.

Essa falta de dados precisos traduz a falta de importância e de valorização em relação à população com deficiência, e evidencia os atrasos da sociedade brasileira. Também nos leva a acreditar que faltam critérios consistentes para uma contagem segura da população brasileira com deficiência, e isso, por si só, é mais uma barreira para a nossa visibilidade. 

Dados da PNAD revelam uma informação ainda mais relevante: quanto mais idade menor o acesso da pessoa com deficiência à educação. A pesquisa mostra que 71,3% das pessoas com deficiência entre 11 e 14 anos frequentam o ensino fundamental, contra 86,1% das pessoas sem deficiência. No ensino médio, a taxa de frequência é de 54,4% entre as pessoas com deficiência de 15 a 17 anos, contra 70,3% das pessoas sem deficiência. No ensino superior, na faixa entre 18 e 24 anos de idade, a frequência é de, respectivamente, 14,3% e 25,5%.

A taxa de analfabetismo das pessoas com deficiência é de 19,5%, enquanto a das pessoas sem deficiência é de 4,1%. Por que cerca de 20% das pessoas com deficiência não são sequer alfabetizadas? A resposta é o capacitismo estrutural, que começa nas atitudes capacitistas das famílias, que, por medo e proteção, acabam isolando e impedindo o ingresso da criança com deficiência na vida escolar, até chegar na principal e inicial forma de exclusão, que é o ambiente escolar.

Além disso, a falta de acessibilidade nas escolas acontece em todas as dimensões: arquitetônica, metodológica, instrumental, comunicacional, digital, programática, atitudinal e natural, descritas pelo consultor em inclusão Romeu Sassaki no livro “As sete dimensões da acessibilidade”, publicado em 2019.

A idade escolar é a melhor fase para iniciar a cultura de inclusão de pessoas com deficiência, algo que temos feito, infelizmente, apenas nos ambientes corporativos e há bem pouco tempo. Trabalhar a cultura de inclusão nesse momento é um processo sustentável, que contribui com a qualificação para a socialização e o desenvolvimento pessoal em uma fase muito importante da vida e antes mesmo de chegar ao mercado de trabalho. As escolas precisam estar atentas a isso e buscar inspiração nas ações de inclusão da pessoa com deficiência que já estão ocorrendo no mercado de trabalho. 

Quando perguntamos onde estão as pessoas com deficiência, abrimos um leque de interpretações. Quem não é contabilizado também não é percebido. Mas nós existimos, apesar da cultura em favor da nossa inexistência. O capacitismo aparece quando não somos considerados na contagem da população.

A “invisibilidade” das pessoas com deficiência está diretamente ligada à falta de entendimento sobre nós. É preciso quebrar as barreiras, entender que a deficiência não escolhe credo ou classe social. Portanto, não basta quebrar a barreira arquitetônica sem derrubar a barreira atitudinal, para que o resultado não seja apenas a adaptação do espaço físico. Até porque adaptar não é criar acessibilidade, e, para uma estrutura ser acessível, é preciso que seja projetada e construída com a participação da pessoa com deficiência. 

Por esses motivos, os dados que dão conta do tamanho e da qualidade da população com deficiência no Brasil também podem apoiar e direcionar ações de inclusão produtiva, que não apenas abrem oportunidades para aumentar a visibilidade, mas garantem nosso desenvolvimento e nossa participação efetiva na sociedade.

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