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Opinião

Precisamos falar sobre concorrência

A gente sabe como esse processo pode ser desgastante em vários níveis. Mas quando ele impacta diretamente na entrega para clientes da casa ou na saúde financeira da agência, aí já não fecha a conta


20 de dezembro de 2022 - 7h44

(Crédito: Unsplash)

Depois de mais de um ano em obras, finalmente me mudei para a minha casa atual. Quem já passou por isso conhece bem os perrengues. Um quebra-quebra maluco, passando por uma viga surpresinha aqui, um vizinho pouco compreensível ali e, a não ser que tope atrasar alguns meses a sua mudança, você vai morar em uma obra não finalizada por um tempo.

Mas, como praticamente tudo na vida, estar rodeado dos parceiros certos deixa o processo mais fácil e o sonho menos distante. Por outro lado, uma escolha equivocada pode jogar por terra um momento crucial na vida da família toda. Reformas são praticamente testes de resistência para qualquer casamento.

Então, como saber ao certo quem vai criar a sala, o quarto ou a cozinha o lugar mais importante do mundo? Bem, no meu caso, o processo de seleção foi assim: pesquisei muitos escritórios de arquitetura no Instagram, em sites e por indicação de amigos; separei aqueles que têm mais a ver com meu gosto, vontades e necessidades e perguntei para várias pessoas como é trabalhar com eles. Com todas as respostas em mãos, procurei apenas os que ticaram todas – ou pelo menos a maioria das casinhas.

Depois de várias conversas, cheguei naquele que me pareceu o ideal. No nosso primeiro papo depois do martelo batido, eles me pediram referências do que eu curto, uma espécie de briefing do briefing.

Foram horas separando imagens e me imaginando morando naquela sala, com o piso daquela outra e as armários de uma terceira. Basicamente, eu me mudei para o Pinterest. Dias depois de dividir o deck com eles, recebi a resposta dos arquitetos: “Acho que não somos o escritório adequado para você. Essas referências, apesar de lindas, não são o nosso perfil”. Pode me chamar de louca, mas aquela resposta só me fez querer trabalhar com eles ainda mais. Afinal, alguém que conhece e defende sua visão criativa a ponto de abrir mão de um cliente só pode ser muito bom. Ali ficou claro que era justamente esse tipo de parceiro e entrega que eu queria. Ajustamos as arestas, descobrimos nossos pontos convergentes, e o resto é história com final feliz. Meu feeling foi muito mais assertivo do que qualquer PPT.

Se você chegou até aqui, deve estar se perguntando: “Mas por que ela está me contando isso, justo aqui, nesta plataforma?” A resposta é simples: porque eu não estou falando necessariamente de arquitetura, estou falando de escolher os parceiros ideias para construir algo importante e a longo prazo. Pode ser uma casa, um apê, uma marca.

E é por isso que precisamos falar dela, a tal da concorrência.

Nesse desenho de processo, emulamos um trabalho do dia a dia num período curto e sem interação. O briefing chega e, em um período relativamente curto, entregamos um trabalho supercompleto, como se fôssemos íntimos da marca. Para isso, equipes de todas as áreas (na maioria das vezes, sêniores) se desdobram em mil ou deixam de lado os jobs dos clientes da casa para fazer a melhor campanha de suas vidas – da Big Idea ao wobbler moleque – mesmo sem saber no que vai dar. 

Se fosse essa a dinâmica para selecionar o escritório de arquitetura ideal, eu teria recebido projetos de 5 ou 6 escritórios, escolheria meu preferido para executar e só pagaria por ele, mesmo que todos tenham trazido ideias e soluções incríveis para minha casa dos sonhos. Esse processo teria gerado para os concorrentes um timesheet que está mais para, desculpe meu francês, um timeshit. Até para quem trabalha com cálculos estruturais, é uma equação difícil de resolver e um problema recorrente para toda a indústria. Vai sempre ter alguém querendo contratar um arquiteto ou uma agência de publicidade. Pelo menos assim espero.

Com tantos pontos envolvidos nesse processo, eu pergunto: seria esse o melhor jeito de selecionar um parceiro de comunicação para uma marca?

Claro que uma relação de agência e cliente deve ser 100% calcada em confiança e, para se criar uma parceria forte, essa deve ser estabelecida com responsabilidade desde o dia 1. A ideia de construir a longo prazo não é apenas desejável, é vital para vermos os ponteiros se mexerem. Mas a saudabilidade da relação se mede no dia a dia, não dá para simular uma vida a dois em cativeiro. Salvo nas culturas em que os enlaces matrimoniais não são calcados em relações emocionais, ninguém casa antes de namorar, certo? Considerar a química, histórico, perfil de desejos e entregas sempre serão os melhores indicadores do encaixe entre as duas potenciais parceiras. Esses, sim, deveriam ser os critérios para estabelecer relações produtivas.

Para ajudar na reflexão, deixo aqui minha pequena contribuição com práticas que considero efetivas e funcionais para todo mundo:

– Tenha a clareza do tipo de entrega e perfil que sua marca precisa. Pesquisar o trabalho para fazer uma pré-seleção bem pensada das agências participantes já é meio caminho andado para um processo eficaz;

– Entenda a cultura da agência e se ela tem fit com a da empresa. Nada mais frustrante do que um clash de culturas;

– Na própria apresentação de credenciais, disciplinas e trabalhos prévios da agência você já vai ter uma bela amostra de como seria trabalhar em parceria. Aproveite esse momento para ouvir atentamente e ler as entrelinhas;

– Escolher é a arte de abrir mão. Pergunte-se do que você não pode abrir mão de jeito nenhum e use isso como régua;

– Pesquise os profissionais que compõem a liderança da agência. Normalmente pessoas da liderança, os principais interlocutores, já passaram por outros lugares e conhecem bastante gente;

– E, agora, talvez o mais importante: o tal do feeling, a famosa intuição, considerando aquilo que não está em nenhuma apresentação de credenciais ou portfólio. Nada atua tão bem na matemática de resultados do que uma boa química.

A gente sabe como um processo de concorrência pode ser desgastante em vários níveis. E, tudo bem, ninguém falou que seria fácil. Para falar a verdade, nada como um bom desafio para crescer, aprender e sair melhor do que entrou. Mas quando isso impacta diretamente na entrega para clientes da casa ou na saúde financeira da agência, inviabilizando coisas importantes como dar aumentos ou ampliar o time, entre outras necessidades, aí já não fecha a conta. Em termos literais e metafóricos.

Está na hora de repensarmos os processos para a seleção de parcerias.

Só não vamos fazer uma concorrência nos moldes atuais para isso, combinado?

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