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Só constrói fortalezas quem olha para as fragilidades

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Opinião

Só constrói fortalezas quem olha para as fragilidades

Quando foi a última vez que você deu os créditos às suas vulnerabilidades?


1 de fevereiro de 2024 - 14h01

(Crédito: Oksana Tkachova/Shutterstock)

Se ser uma mulher na nossa sociedade já não é um mar de rosas, ser uma líder mulher dentro de um mercado de trabalho majoritariamente composto por homens, cis e brancos é, no mínimo, desgastante e muito solitário. Não porque nos faltam grandes parcerias, mas porque, na maioria das vezes, não encontramos um par com quem compartilhar as experiências em comum, as aflições, frustrações e os muitos desafios com relação aos questionamentos sobre a nossa capacidade de liderança e competência profissional. É, com toda certeza, uma jornada solitária, mas também de muito aprendizado e de um mergulho profundo no seu eu.

Meu ano de 2023 foi de muitos aprendizados, pessoal e profissionalmente. Tive diversas experiências que me fizeram olhar a maneira como posso lidar com os desafios que surgem no dia a dia, além de usá-los como aprendizados e ferramentas para uma melhor liderança e gestão empresarial, emocional e de tempo para curtir a vida que venho construindo para a pessoa física por trás da sócia e CEO.

Geralmente, quando me deparo com um texto nas redes sociais sobre erros, acertos e aprendizados de modo geral, sou levada a acreditar que para o “outro” é muito mais fácil enfrentar algumas dificuldades. Principalmente se esse outro for uma pessoa do sexo masculino. Tenho me perguntado se não sou levada a acreditar nessa facilidade, quase pragmática, justamente por ser colocada nesse lugar de questionamento o tempo todo. Então, nada mais justo do que usar esse canal para expressar e compartilhar esses aprendizados que não nascem apenas de experiências positivas – quem me dera! -, e  dar o devido destaque a essas dificuldades que me fizeram aprender, inclusive, o que não fazer outra vez.

#1 – O poder que as líderes mulheres têm de influenciar e puxar outras mulheres

O primeiro é mais do que um aprendizado, é uma certeza do que venho construindo ao longo desse caminho. Durante esse ano tive experiências profissionais nas quais criei novos vínculos. Esse processo desencadeou uma sequência de oportunidades para envolver mulheres de áreas diversas em projetos, vagas de trabalho e outras situações. Hoje, enxergo com muito mais clareza o papel que tenho e utilizo minha experiência para identificar esses talentos e ajudar a projetar e dar luz a essas mulheres.

#2 – Compartilhar conhecimento enriquece o nosso próprio conhecimento

Em 2023 passei a ser mentora da Top2You, empresa especializada em mentoria corporativa, e está sendo uma experiência enriquecedora. Compartilhar conhecimento me ajudou a organizar melhor algumas informações e ideias dentro da minha cabeça, me rendendo melhores insights para a gestão do time e do negócio da Gana. No dia a dia, passamos a maior parte do tempo debruçadas sob as mesmas demandas e acabamos por deixar de lado conhecimentos que estão guardados lá no fundo da nossa estante de informações. Compartilhar têm me ajudado a revisitar alguns desses lugares e, principalmente, compreender que as dificuldades e receios que já tive podem ser agora de outras pessoas. Dividir esse conhecimento tem me feito olhar para os meus medos com mais humanidade e tem me ensinado que todos os dias posso aprender algo novo e muitas vezes algo que já sabia, mas de uma outra forma.

#3 – A diferença entre ser funcionária e sócia é estarrecedora!

Quando assumimos o papel de funcionário em uma empresa, firmamos diversos compromissos e responsabilidades com a companhia e o time. No entanto, existe uma hierarquia com a qual podemos contar em momentos turbulentos, seja para novas ideias ou para solucionar questões dos clientes. Sempre existe alguém com maiores soluções e que pode assumir essa responsabilidade por você. Quando me tornei sócia, entendi o peso que é ser a responsável por esse time e precisei aprender a lidar com a expectativa que me é imposta, além da expectativa que eu mesma coloco sobre mim.

É preciso garantir, todos os dias, que a gestão está sendo feita da melhor forma para que, não apenas o trabalho seja feito mas, também, para que os funcionários se sintam seguros sob o meu comando. Além disso, existe um mundo dentro de uma empresa que ninguém vê, onde o possível e o impossível estão sendo feitos para mantê-la viva e crescendo dia após dia. Trabalhar a inteligência emocional foi uma das ferramentas que encontrei. Aprendi a ceder e quebrar algumas verdades e paradigmas existentes sobre o que é ser uma líder mulher, negra e nordestina dentro deste mercado. Aprendi, também, que um dos grandes valores que temos quando ocupamos esse lugar é o de saber ouvir as pessoas e integrar suas opiniões às decisões que estão sendo tomadas. É assustador, ao mesmo tempo em que é realmente transformador.

#4 Síndrome da impostora

Não importa a sua idade, profissão, sua função ou o tempo que você tem de mercado, a síndrome da impostora sempre bate à nossa porta como uma velha amiga de infância. Aquela que sabe do que ninguém mais sabe e que pode revelar ao mundo o seu pior segredo: você não serve pra isso. É assim que a síndrome da impostora faz com que eu me sinta e tenho certeza que você também. Dessa lista, me deixar afetar por esse sentimento é uma das coisas que não gostaria de repetir nunca mais. Se fosse simples assim, tudo bem.

Um dos aprendizados que ganhei ao enfrentar essa arqui-inimiga foi o entendimento de como buscar as ferramentas adequadas para lidar com esses momentos. Entender o que me cabe, o que não me cabe e o que estão tentando fazer me caber. Se é que isso faz algum sentido para você. Existem algumas situações em que as decisões difíceis precisam ser tomadas e, às vezes, é você quem precisa cuidar disso. É muito comum se ver em um não-lugar nesses momentos, duvidar da sua capacidade em momentos de cansaço ou no sobe e desce que é a vida. Inclusive, chegando a pensar que seria mais fácil se você não ocupasse esse lugar.

Mas aí você se depara com a realidade de que ocupar qualquer espaço no mundo é tomar decisões difíceis, é ter que entregar quando as ideias e soluções parecem esgotadas. Não é uma questão de estar pronto, mas de sempre se preparar para enfrentar o que estiver por vir. E, claro, o maior aprendizado é se cercar de pessoas que acreditam, confiam e validam a sua capacidade. Eu não preciso fazer nada sozinha, e nem você deveria.

#5 Me posicionar em um mercado que me coloca dentro de uma “caixinha”

“Com grandes poderes, vem grandes responsabilidades”. A realidade da ficção se faz mais do que presente no mercado de trabalho. Desde que me tornei CEO da Gana, foi muito natural que os olhares logo se virassem para uma das poucas mulheres negras em um cargo de alta liderança executiva dentro do mercado publicitário. O que não acredito ser natural é a forma como as pessoas passam a lidar com essa posição, que vai muito além da batalha pela mudança nas estatísticas.

Criar o equilíbrio entre fazer um posicionamento que mostre a importância em assumir esse cargo na Gana, uma empresa que desde o seu nascimento carrega a essência da diversidade e da inclusão dentro do setor e, ao mesmo tempo, não permitir que exista uma “tokenização” da imagem da mulher negra CEO é o verdadeiro desafio aqui.

O mercado já coloca profissionais mulheres, em sua totalidade, dentro de “caixinhas” de pertencimento e com certas limitações. Mulheres negras, então, são colocadas sempre em um lugar de especialistas em determinados temas, grupos, interesses e de vagas afirmativas. Nunca enquanto especialistas de mercado, líderes dos setores e outras nomenclaturas reservadas aos colegas de profissão do sexo masculino. Mais uma vez, meu grande aprendizado foi o de saber o que me cabe.

#6 Procrastinar decisões difíceis por ansiedade

E, veja só, se esse não é um aprendizado que a síndrome de impostora me trouxe? Quantas e quantas vezes você se pegou pulando de tarefa em tarefa e passando para amanhã, para o amanhã do amanhã, decisões difíceis de serem tomadas por mera ansiedade? Há quem diga que mulheres líderes são emocionais demais e, aquelas que não são, se tornam líderes melhores. Eu discordo completamente. É muito difícil ser um bom líder se você não reflete sobre tudo o que pode ser afetado por suas decisões. Uma decisão tomada dentro da empresa pode desencadear muitas situações na vida profissional e, principalmente, na vida pessoal do seu time e, por consequência, pode afetar a vida de suas famílias.

Mas há quem diga que o “bom líder” não pode se preocupar com isso, ou que a sua liderança será afetada. No meu caso, a carga emocional juntamente com a carga de vivências e propósitos que carrego são sim muito presentes. Isso torna ainda mais difícil que eu tome decisões de pronto. No entanto, essas decisões precisam acontecer para o bem da empresa e do coletivo ali presente. É complexo se dar conta de que você está fazendo isso, e ainda mais complexo é encontrar formas de lidar com isso, e com o que vem depois disso, sem enrijecer.

Muitos podem ler esse texto e pensar que estou expondo fragilidades e como isso pode impactar na minha gestão. Mas, para mim, dividir com vocês meus aprendizados, dificuldades e angústias é mostrar que o dia a dia não é um conto de fadas, que existem problemas e desafios, e que por trás de uma líder, existe também um ser humano, uma mulher que tem seus medos e que diariamente precisa se superar e se provar. E lembrem-se sempre: a jornada pode até ser solitária, mas você não precisa fazer nada sozinha.

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