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Temos que incluir mais mulheres trans e travestis no mercado de trabalho

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Opinião

Temos que incluir mais mulheres trans e travestis no mercado de trabalho

Em uma amostra de 528 pessoas trans com trabalho no estado de São Paulo, apenas 16,7% estavam no mercado formal


23 de junho de 2023 - 12h40

(Crédito: reprodução)

Aurora Rosa é uma colega de trabalho. Mulher trans, me contou que o principal entrave para transicionar, ou seja, fazer a transição de gênero, era o medo de não ter oportunidade de emprego. Não é para menos. O mercado de trabalho, especialmente o brasileiro, exclui mulheres trans e travestis. Ponto. 

Vivemos no país que mais mata pessoas trans no mundo, segundo relatório divulgado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) em janeiro. Só no ano passado, foram 130 transexuais e travestis mulheres mortas. A transfobia faz com que elas tenham que enfrentar violências e mais: obriga que a maioria delas tenha que se prostituir para sobreviver. Neste mês de junho, tão emblemático na luta pelos direitos civis e pela busca contínua da igualdade de justiça para a comunidade LGBTQIAPN+, eu posso dizer que tenho orgulho de trabalhar com pessoas como a Aurora. 

Gaúcha, nascida no interior do Rio Grande do Sul, decidiu transicionar aos 21 após tratamento psicológico. Consultora de beleza na L’Oréal Brasil, me contou que ser uma mulher trans acabou não sendo um empecilho para ela trabalhar, ao contrário do seu medo inicial. Mas sabemos que o nosso setor é uma exceção. O ramo da beleza é, tradicionalmente, um dos que mais acolhe mulheres trans, homens gays, travestis, mulheres pretas… 

“Hoje, me vejo abrindo portas também para outras mulheres trans se espelharem, saírem da vida na rua e dos perigos noturnos e deixarem de se colocar como um objeto sexual. Sinto o maior orgulho de ser essa mulher que nunca precisou ter que passar por essas dificuldades de rua, mas, ao mesmo tempo, me responsabilizo com a causa LGBTQIA+ e busco lutar a favor dos nossos direitos”, ela me contou. 

Aurora começou a trabalhar aos 15 anos vendendo produtos de beleza de porta em porta. Aos 18, entrou para uma loja de departamentos e se tornou líder do setor de perfumaria. Depois da transição de gênero, se formou como maquiadora profissional e ingressou na faculdade. Me disse que fazer parte da empresa hoje é parte da realização de um sonho não só por ser uma colocação na área de beleza, mas por se sentir acolhida e ouvida. Isso não é pouco para uma mulher trans. 

Em uma amostra de 528 pessoas trans com trabalho no estado de São Paulo, apenas 16,7% estavam no mercado formal, segundo uma pesquisa da Fapesp de 2020. Ao considerar a identidade de gênero, vemos um recorte mais alarmante do peso do machismo e da misoginia: 13,9% das mulheres trans e travestis tinham emprego formal, em comparação com 59,4% de homens trans. 

Um relatório da Antra mostrou também que 88% das pessoas trans entrevistadas acreditam que as empresas não estão preparadas para contratar ou garantir a permanência de profissionais trans em seus quadros. 

Na tentativa de ocupar espaços no mercado de trabalho, mulheres trans precisam lutar contra o preconceito e contra a hipersexualização de corpos transgêneres. A expulsão de casa, a evasão escolar e o preconceito institucional são outros entraves que elas enfrentam na busca por uma colocação. 

Alguns programas importantes têm sido lançados recentemente para essa parcela tão invisibilizada da população. E quando eu digo invisibilizada não é um exagero. Nem mesmo na pesquisa de 2022 o IBGE incluiu no questionário opções de identidade de gênero que não são homem ou mulher (como travestis ou pessoas não binárias). Não sabemos, no conjunto da população brasileira, quantas pessoas são cisgêneros ou trans. Isso impacta em falta de políticas públicas para essa parcela da população. 

Em janeiro deste ano, ativistas trans e defensores dos direitos humanos fizeram um protesto na praça da Cinelândia, em frente à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, com faixas e cartazes e protestaram contra a discriminação, a violência e a exclusão da população trans de espaços como o mercado de trabalho e a educação. 

Na política, além de projetos de lei com cotas para pessoas trans, temos visto um avanço no cenário político que, pela primeira vez, tem representantes trans em Brasília. As eleições de 2022 elegeram Erika Hilton e Duda Salabert, que figuraram como duas das pessoas mais votadas para o Congresso Federal. 

O acesso, a qualificação e as oportunidades transformam não só a vida das pessoas trans, mas a sociedade como um todo. Precisamos encontrar meios de oferecer reais oportunidades para essas pessoas. Só assim vamos conseguir avançar no combate ao preconceito e, quem sabe um dia, sair do topo do ranking de sermos o país com mais assassinatos de pessoas trans no mundo. 

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