“Precisamos ser mais cuidadosos ao prever o futuro”, diz Amy Webb
Amy Webb, CEO do Future Today Institute, avalia desafios de mapear tendências diante dos avanços da tecnologia
Amy Webb, CEO do Future Today Institute, avalia desafios de mapear tendências diante dos avanços da tecnologia
Thaís Monteiro
5 de março de 2025 - 6h00
Veterana de South by Southwest (SXSW), a futurista e CEO do Future Today Institute, Amy Webb, é de longe uma das figuras que mais atraem público no evento. O público começa a ocupar a fila do Ballroom D às sete da manhã. Lá, ela é uma estrela. “Às vezes, é difícil, porque eu sinto vontade de ir para uma sessão e eu vejo 100 pessoas e falo com todas essas pessoas. A maior parte do meu South by é assim. É tentar conseguir comida e depois tentar chegar a uma sessão e conhecer todas essas pessoas incríveis em todos os lugares”, descreve.
Amy Webb chama atenção para a crescente influência de empresários da tecnologia no governo (Crédito: Reprodução/ SXSW)
Mas Amy também celebra os encontros inusitados que o evento lhe proporciona. No bar do Driskill Hotel, ela teve a chance de conhecer a comediante Amy Poehler. “Muitas vezes, as celebridades que estão lá também são apenas pessoas comuns andando por aí. Eu estava apenas curtindo no bar com alguns amigos, e essa pessoa estava sentada ao meu lado. Eu me virei e pensei: ‘Caramba, é a Amy Poehler!’. Ela foi super simpática, bem normal, só conversando”, lembra.
Sua lista de vivências inusitadas em Austin não para por aí. A futurista guarda na memória o momento em que alimentou pets robôs e participou da recriação da experiência da série Westworld, feita pela HBO em 2018. “Todo ano acontecem experiências malucas e incríveis, e você conhece pessoas realmente interessantes. Simplesmente não há nada igual no mundo”, afirma. A primeira vez de Amy Webb como palestrante no evento foi em 2005.
Normalmente, Amy fica no SXSW de quinta à terça-feira. Seu dia começa com tacos no café da manhã. Depois, tenta ir no máximo de palestras que pode com o FOMO em dia (sigla para fear of missing out) e busca andar o máximo que pode, para experienciar o que acontece nas ruas de Austin. Seu FOMO só não afeta as atividades noturnas. “Os brasileiros não entendem isso. Eu durmo muito cedo, por volta das 21h, que é justamente quando todas as festas estão começando. Se eu não me hidratar bem e não conseguir dormir, fico um desastre”, ri.
Ao Meio & Mensagem, Amy Webb dividiu perspectivas sobre as mudanças no trabalho de futurismo e opinou sobre a aproximação das big techs com o governo dos Estados Unidos.
Meio & Mensagem — A previsão do futuro se tornou mais difícil nos últimos anos devido ao ritmo das mudanças tecnológicas?
Amy Webb — Diria que não ficou mais difícil, mas precisamos ser mais cuidadosos. Todo mundo no Future Today Institute é muito bom em previsão estratégica, mas até nós, às vezes, podemos nos distrair um pouco. Todo mundo está falando sobre inteligência artificial generativa. Devemos pensar mais sobre IA generativa? A resposta é que continuamos fazendo o que sempre fizemos. O foco se tornou um pouco mais desafiador. Também estamos lidando com muito mais informações porque há muitas mudanças acontecendo. A boa notícia é que nossa metodologia é escalável. Não precisamos aprender a fazer nada novo, apenas precisamos fazer mais do que já fazemos. Isso é, em parte, o motivo pelo qual nossa empresa está crescendo. Precisamos de mais pessoas para realizar esse trabalho.
M&M — Como funciona a metodologia do Future Today Institute?
Amy — Qualquer pessoa pode fazer as partes principais, que envolvem procurar sinais do que está influenciando o futuro. Esses são os sinais de mudança. Mas as pessoas precisam ter muito cuidado para diferenciar o que é uma tendência do que é apenas algo passageiro, certo? Essas são as coisas que podemos saber, mas também precisamos combinar isso com o que não sabemos. E essas são as incertezas. Essa é a parte que muita gente esquece. Elas veem tendências e pensam: “Pronto, terminamos”. Mas é preciso olhar para a interseção entre as tendências e as incertezas. Qualquer um pode criar uma lista de incertezas. Por exemplo, no Brasil: o custo dos alimentos vai aumentar ou diminuir? A inflação vai crescer ou cair? As mudanças climáticas vão se intensificar ou desacelerar? Depois, combinamos esses elementos com a pergunta “e se?”. Isso é um tipo de pensamento baseado em cenários. Qualquer pessoa pode pensar como um futurista. Na minha opinião, todos deveriam pensar como um futurista. Agora, para fazer esse trabalho de forma estruturada, é preciso treinamento. Toda empresa deveria ter essa capacidade.
Quem está prevendo o futuro em Austin?
M&M — No ano passado, você mencionou que a liderança estava agindo com medo da inteligência artificial (IA) e FOMO (sigla para fear of missing out, que, em tradução livre, significa “medo de ficar de fora”). Isso mudou no último ano?
Amy — O que você acha? Não, eles ainda estão operando com FUD (medo, incerteza e dúvida) e FOMO. Se algo mudou, foi para pior. Aqui está um ótimo exemplo: algumas semanas atrás, o Deepseek, um sistema desenvolvido na China, lançou seu produto e, de repente, as ações da Nvidia despencaram. Deepseek e Nvidia não têm muita relação entre si. Mas as pessoas perderam a cabeça. “Isso significa que não precisamos mais de bilhões de chips, de todo esse dinheiro e tudo mais”. E a resposta é: você realmente não precisa, se estiver apenas copiando ou clonando o sistema de IA de outra pessoa. Mas, para avançarmos para o futuro, precisamos continuar construindo coisas novas. Esse é um exemplo do medo e das emoções que estão impulsionando as decisões.
M&M — Estamos na era da desinformação. Como isso impacta o trabalho de futurismo?
Amy — Sempre tomamos muito cuidado com as fontes das nossas informações. Mas acho que, quando há muita confusão ou incerteza, torna-se mais difícil enxergar o futuro com clareza e as pessoas ficam impacientes. Isso pode dificultar nosso trabalho de convencer líderes e empresas a tomarem as decisões corretas.
M&M — No ano passado, você fez um alerta sobre os “messias da tecnologia”. Recentemente, alguns líderes do setor, como Elon Musk e Mark Zuckerberg, se aproximaram da política. Como você vê essa mudança?
Amy — Diria que, se algo mudou, foi para pior, e isso se deve, em parte, ao resultado da eleição nos Estados Unidos. Veja o quão poderoso Elon Musk é hoje. Quando o presidente Trump tomou posse, fiquei chocada porque havia Trump na frente, logo depois os CEOs de tecnologia e, atrás deles, os indicados para o gabinete. Nunca vimos nada assim antes na história americana. Isso dá uma noção do poder que esses oligarcas da tecnologia têm, não apenas nos Estados Unidos, mas no mundo todo.
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