Aquilo que faltou no SXSW
Acabei de chegar da minha primeira experiência no SXSW - uma experiência incrível em muitas dimensões
Acabei de chegar da minha primeira experiência no SXSW - uma experiência incrível em muitas dimensões
17 de março de 2025 - 19h19
Muitos colegas já estão brilhantemente pontuando, em outros artigos, as melhores passagens. Escrevo aqui um olhar complementar, não como crítica, mas como uma lente de oportunidade. Quero falar sobre o que significou para mim e aquilo que “faltou”, pelo menos na vivência que tive. Afinal, o SXSW é diferente para cada pessoa que participa. Minha reflexão aqui, com a ideia de “falta”, é mais um convite à reflexão sobre aquilo que pode ser mais aprofundado nas próximas edições.
É claro que, lá em Austin, muita coisa foi falada, discutida e apresentada. E é impossível assistir às mais de 450 sessões e atividades que o festival promove. Mas muita coisa a gente acaba sabendo sem ter participado, pelos rápidos encontros com pessoas nos cafés, nas filas e nas ruas. Então, quando falo em ‘falta’ aqui, pode ser tanto sobre o que de fato não esteve presente, quanto sobre o que passou despercebido pela superficialidade com que o tema foi tratado.
1. Regeneração e seus impactos práticos no dia a dia de marcas e negócios: Esse é um ponto essencial. A regeneração vai além da sustentabilidade, focando na recuperação de ecossistemas e impactos sociais de maneira profunda. O que faltou, na minha visão, foi uma discussão prática sobre como empresas podem integrar práticas regenerativas de forma tangível, especialmente considerando os desafios das mudanças climáticas. Participar de algumas rodas sobre sustentabilidade foi interessante, mas ainda achei que faltou trazer o conceito de regeneração com mais força
A sustentabilidade ainda domina as conversas, mas muitas vezes se resume a compensações. O que precisamos é de um movimento que vá além de mitigar e comece a restaurar. Empresas precisam transformar sua pegada ecológica em impacto positivo real para o planeta. Marcas como a Patagonia por exemplo já estão avançando nisso, mas isso ainda é exceção, não regra. A maioria ainda vê a sustentabilidade como algo periférico, não central.
Nos encontros mais informais, ficou claro que a regeneração está sendo reconhecida, mas as práticas concretas são limitadas. Precisamos de mais exemplos reais de empresas que não só reduzem impacto, mas restauram. Isso envolve repensar cadeias de suprimento, investir em design regenerativo e colaborar com organizações que recuperam habitats. A regeneração exige uma transformação sistêmica, e isso não foi suficientemente discutido em Austin. A sustentabilidade já não é mais suficiente.
Nos encontros mais informais, ficou claro que a regeneração está sendo reconhecida, mas as práticas concretas são limitadas. Precisamos de mais exemplos reais de empresas que não só reduzem impacto, mas restauram. Isso envolve repensar cadeias de suprimento, investir em design regenerativo e colaborar com organizações que recuperam habitats. A regeneração exige uma transformação sistêmica, e isso não foi suficientemente discutido em Austin.
Estamos só no começo. A regeneração precisa ser mais do que discurso — ela precisa se transformar em estratégias reais e escaláveis, que mostrem como pode ser parte de um modelo de negócios sustentável e rentável.
Nomes que poderiam fazer parte da discussão e adoraria ouvir: Yvon Chouinard, Ellen MacArthur e Andrea Alvares.
2. Diversidade, Equidade e Inclusão: Embora o tema tenha sido mencionado em algumas palestras, senti falta de um debate sobre como a comunicação das marcas tem lidado com esse retrocesso. Muitas empresas estão reduzindo suas iniciativas de D&I, o que pode gerar impacto direto na percepção do público sobre marca, no engajamento do público e até em seus resultados financeiros. No cenário atual, consumidores esperam posicionamentos mais genuínos e ignorar essa pauta pode representar um risco para a relevância das marcas.
Essa tendência é preocupante, pois a inovação surge da diversidade de perspectivas. Quando as empresas retrocedem, limitam sua capacidade de gerar inovação e adaptabilidade e deixam de promover uma transformação social justa. A falta de um compromisso real com D&I será um obstáculo para o futuro das empresas, que vão perder espaço para aquelas que adotam a diversidade de forma genuína e estruturada. No SXSW, o tema foi abordado, mas a sensação é que não foi aprofundado como deveria.
Nomes que poderiam fazer parte da discussão e adoraria ouvir: Bozoma Saint John e Tina Tchen.
3. Biotecnologia + Natureza: Essa combinação é uma das mais poderosas para o futuro, especialmente quando falamos em criar soluções que interagem com a natureza de maneira mais harmônica. A intersecção entre biotecnologia e regeneração de ecossistemas poderia ter sido explorada mais profundamente, principalmente no impacto que isso pode ter na comunicação das marcas. O consumidor quer saber de onde vêm os produtos que consome e como eles impactam o meio ambiente. Para as empresas, contar essa história de forma convincente pode ser um diferencial competitivo.
Além disso, o uso de biotecnologia para criar produtos não apenas mais sustentáveis, mas também regenerativos, pode transformar a maneira como produzimos e consumimos. No caso da moda, por exemplo, tecnologias que promovem materiais biodegradáveis ou regenerativos poderiam ser mais exploradas, oferecendo alternativas reais para um setor tão poluente. Mas o debate sobre como integrar essas soluções de forma prática e escalável na indústria ainda ficou aquém do que precisamos. É uma oportunidade única para impulsionar uma revolução verde, criando produtos que não só minimizam impactos ambientais, mas também ajudam a restaurar os ecossistemas ao longo de toda a cadeia produtiva.
Nomes que poderiam fazer parte da discussão e adoraria ouvir: Neri Oxman e Alice Rawsthorn.
4. Cultura Global, Diversidade Regional e Ancestralidades: Esse é um território que não teve o espaço que realmente merece. Vivemos em um mundo cada vez mais globalizado, mas as perspectivas regionais e as ancestrais continuam a ser subrepresentadas nas grandes discussões. No SXSW, senti que faltou uma maior celebração da diversidade regional e uma reflexão profunda sobre como as culturas locais e as ancestralidades influenciam e enriquecem a inovação. A forma como os saberes tradicionais podem ser aplicados ao desenvolvimento de novos produtos, serviços e soluções — seja na moda, na alimentação ou na tecnologia — não foi discutida de maneira suficiente. Isso é particularmente importante, porque a verdadeira inovação muitas vezes emerge do encontro entre a cultura global e as raízes regionais. As grandes marcas precisam entender que suas estratégias globais não podem ignorar os saberes e as práticas locais, que têm muito a oferecer em termos de sustentabilidade, autenticidade e visão de futuro.
Nomes que poderiam fazer parte da discussão e adoraria ouvir: Ailton Krenak e David Adjaye.
5. Acessibilidade e Inclusão Tecnológica: Um tema que foi amplamente discutido no SXSW foi a inovação tecnológica, especialmente em áreas, como IA e novas tecnologias até em nível quântico, mas o que realmente senti falta foi de um olhar mais profundo sobre como essas inovações estão sendo acessadas e como estão impactando as pessoas. A tecnologia está avançando rapidamente, mas a questão crucial que muitas vezes fica de fora é: como garantir que todos, especialmente em países como o Brasil, tenham acesso a essas inovações?
E mais, como as empresas estão lidando com a inclusão digital de populações marginalizadas, seja em áreas periféricas ou com menos acesso a recursos? Mesmo nos Estados Unidos, onde a tecnologia é mais desenvolvida, a inclusão ainda é um desafio. Como as soluções tecnológicas podem ser realmente universais se não houver um esforço genuíno para trazer essas tecnologias para todos?
O debate sobre como democratizar o acesso à tecnologia e garantir que ela não reforce desigualdades, mas sim crie mais oportunidades, foi um ponto que ficou faltou pra mim. A verdadeira inovação vai além de criar novas tecnologias: é preciso pensar em como elas serão usadas por diferentes públicos e como podemos integrar todos nesse novo futuro digital.
Nome que poderia fazer parte da discussão e adoraria ouvir: Liz Jackson.
Apesar de sentir falta de alguns temas, não posso deixar de reconhecer o quanto o SXSW foi inspirador. As discussões sobre saúde social, longevidade, segurança de dados, conexão humana, storytelling e a epidemia da solidão foram extremamente enriquecedoras. Mas, para mim, o grande destaque foi a energia das pessoas — essa vontade genuína de se conectar, trocar ideias e construir algo juntos.
Foi nos encontros inesperados, nas conversas espontâneas, que o SXSW realmente conquistou um espaço no meu coração. No fim das contas, os temas sempre estarão lá, acessíveis para quem quer estudar e se aprofundar. Mas são as vivências, os diálogos e as conexões humanas que dão profundidade e significado a tudo isso. E, no que realmente importa, são essas trocas que tornam qualquer evento verdadeiramente transformador.
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