CEO do Bluesky provoca Zuckerberg no SXSW
Em meio a debates sobre consequências negativas das redes sociais, Jay Graber apresenta aplicativo como alternativa às plataformas dominantes
Em meio a debates sobre consequências negativas das redes sociais, Jay Graber apresenta aplicativo como alternativa às plataformas dominantes
Thaís Monteiro
10 de março de 2025 - 22h53
Camiseta usada por Jay Graber zombava de Mark Zuckerberg (Crédito: Thaís Monteiro)
A introdução à entrevista com a CEO do Bluesky, Jay Graber, no South by Southwest (SXSW) começou com uma reflexão e um indício de aval por Hugh Forrest, presidente e chief of programming officer do evento.
Forrest subiu ao palco para dar alguns avisos gerais, como faz frequentemente, e então contou que a programação de tecnologia do festival teve início em 1994. Até 2007, o SXSW enfrentou dificuldades em definir o tom da trilha. Foi quando o Twitter foi apresentado no evento que o cenário mudou. “Twitter mudou a complexidade do South by Southwest. De repente, todas as startups e venture capitals do mundo queriam vir ao evento”, contou.
À época, acreditava-se que as redes sociais mudariam o mundo para melhor e, embora reconheça que elas colaboraram para solucionar diversos problemas, Forrest argumenta que também contribuíram para intensificar outros problemas, como divisão extrema, desinformação, isolamento, solidão e suicídios.
Dezoito anos depois da presença do Twitter no SXSW, Hugh encara o Bluesky, rede lançada em 2022, como uma brisa de ar fresco. “Blue Sky feels like what we loved about all the possibilities of social media in 2007 can continue to grow and maintain this vibe”, afirmou antes de introduzir o painel.
O Bluesky nasceu como um projeto no Twitter. A CEO se inscreveu em um financiamento promovido pela empresa em 2019 para novos protocolos abertos. O projeto ficou no guarda-chuva da empresa por dois anos até a executiva decidir torná-lo independente, pois sentia que a iniciativa não avançava na velocidade que deveria.
Em 2023, a plataforma começou a funcionar em modo beta apenas para convidados. Em 2024, foi lançado publicamente. Atualmente, ele soma 32 milhões de usuários e a empresa mantém apenas 21 funcionários.
Diferente das demais plataformas sociais, o Bluesky tem seu código aberto, ou seja, usuários podem acessá-lo, replicá-lo e modificá-lo conforme suas preferências. “Nosso objetivo é focar na liberdade de escolha do usuário e na autonomia do desenvolvedor, para que os usuários tenham opções sobre o que veem e com o que interagem, e os desenvolvedores possam realmente criar sem que nós atrapalhemos”, descreveu.
A executiva vestia uma camiseta que fazia alusão a uma camiseta usada por Mark Zuckerberg. Em setembro, o Zuckerberg usou uma camiseta que dizia, em latim, “ou um César ou nada”. Já Jay Graber usou uma camiseta de mesmo estilo, mas a frase, também em latim, dizia “um mundo sem Césars”, reafirmando o compromisso da empresa em deixar as escolhas na mão do usuário e não de um único CEO, afirmou a head de projetos especiais do Bluesky, Emili Liu, ao HuffPost.
Basicamente, o usuário pode escolher qual algoritmo usar para seu feed, decidir como quer que seu conteúdo seja moderado, entre outras funcionalidades adaptáveis. A ideia de uma rede social descentralizada, no qual o poder também está na mão do usuário, é uma resposta a uma necessidade social.
“A sociedade começa a refletir a estrutura de sua forma dominante de comunicação. Por isso, é essencial que a infraestrutura de comunicação seja democrática, oferecendo às pessoas escolha e permitindo que elas a modifiquem de acordo com suas próprias necessidades e preferências. Construir redes abertas é fundamental para enfrentar os problemas que enfrentamos no mundo. Quando você tem uma rede aberta, você tem também uma forma de comunicação que as pessoas podem adaptar e tornar sua”, argumenta.
Os usuários podem fazer uso de soluções e protocolos do Bluesky para criar sua própria rede social fora do aplicativo. Também é possível criar aplicativos que interajam com o Bluesky. É o caso do aplicativo Flashes, voltado a publicação de fotos e vídeos. Para logar no aplicativo, usuários podem usar seu login do Bluesky e trazer para o Flares o conteúdo em fotos que já publicou no Bluesky.
Questionada sobre o medo de alguns usuários de que o Bluesky vá na mesma direção que outras plataformas populares, Jay argumentou que o protocolo aberto garante que o usuário sempre tenha direito em modificar sua experiência no aplicativo.
“Vamos supor que nós começamos a enfiar anúncios antes de todos os posts, você poderia escolher uma outra timeline no próprio aplicativo, excluir o feed em que estamos colocando os anúncios e instalar um diferente. O fato de que os usuários têm essa escolha significa que nós queremos seguir servindo os usuários. Isso pode acontecer em vários níveis. Se você não gostasse mais do app, você poderia criar um novo app e acessar a mesma rede de contatos. Você mantém sua identidade e dados e muda de aplicativo. Vimos empresas mudando, mas no fim das contas o protocolo aberto assegura uma camada que continuará ali e deixa que os usuários mudem suas preferências e ainda tenham acesso aos componentes sociais disponíveis”, explicou.
O usuário pode levar seus contatos e histórico da rede para outras plataformas que dialogam com o protocolo aberto. Desenvolvedores também podem criar novos aplicativos que podem ter conexão com o Bluesky, como com o nome de usuários, sem necessariamente a empresa estar ciente.
A CEO vê o momento atual no mercado digital – em que as plataformas são questionadas por trazer toxicidade às relações humanas – como uma oportunidade para que novas plataformas se destaquem e reduzam o monopólio das que já são consolidadas.
“Houve muitas empresas dominantes que surgiram e desapareceram, mas as pessoas estão buscando alternativas melhores, que pareçam menos tóxicas, que lhes deem mais controle e que permitam colocar em prática ideias que elas têm há tempos, mas que não conseguiram desenvolver até agora. Estamos construindo um novo paradigma para que isso aconteça. A história da tecnologia é longa e cheia de surpresas”, compartilhou.
“Se há um espaço social que as pessoas não gostam, elas podem customizá-lo, e essa customização está se tornando cada vez mais sofisticada. Não cabe apenas a nós impulsionar essa inovação. O ecossistema aberto significa que, se alguém tiver uma ideia, pode entrar, construir e lançá-la amanhã”, complementou.
Recentemente, a moderação de conteúdo virou pauta quando Mark Zuckerberg anunciou que irá reduzir os esforços nesse sentido para favorecer a livre expressão nas plataformas da Meta. Elon Musk já havia feito o mesmo no X.
Questionada sobre os desafios que o Bluesky enfrentou a respeito desse tema, Jay afirmou que a empresa tem uma abordagem de várias camadas para a moderação de conteúdo. A plataforma tem uma moderação própria, mas o usuário pode utilizar outros serviços de moderação de conteúdo e adaptar o que deseja ou não ver na plataforma.
Por exemplo, o usuário pode escolher não ver publicações de políticos ou demandar que todas as imagens feitas com inteligência artificial tenham um rótulo de identificação. O princípio é dar aos usuários controle sobre sua experiência.
“Espero que as pessoas não vejam as redes sociais como algo inerentemente tóxico, porque há muitas coisas boas nelas, e ainda há muito que pode ser feito para melhorá-las. E se a inovação vier apenas de uma empresa, muita coisa vai ficar para trás”, disse.
Como forma de monetizar a plataforma, o Bluesky estuda adicionar assinaturas para acessar ferramentas exclusivas, cobrar por serviços voltados a desenvolvedores e avaliar a criação de um ecossistema de serviços onde os usuários criam ferramentas próprias, como de moderação de conteúdo ou feeds personalizados e podem cobrar por isso. O Bluesky ficaria com uma porcentagem da transação.
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