Cecília Alexandre: da enxurrada de conteúdo ao plano de ações
Entre cultura, tecnologia, dados e ESG, CMO da Kraft Heinz no Brasil leva bagagem valiosa para casa e já pensa nas próximas idas ao SXSW
Entre cultura, tecnologia, dados e ESG, CMO da Kraft Heinz no Brasil leva bagagem valiosa para casa e já pensa nas próximas idas ao SXSW
Giovana Oréfice
16 de março de 2023 - 10h11
A Kraft Heinz detém no Brasil um portfólio com três marcas diferentes. Contudo, o ponto em comum entre todas elas é o acompanhamento do consumidor e suas necessidades. Cecília Alexandre, ou Ciça, CMO da empresa, veio ao South by Southwest pela primeira vez neste ano e declara já querer voltar.
Apesar de ter chegado ao festival com uma agenda prévia dos temas que pretendia acompanhar, os insights obtidos em Austin foram muito além do que esperava. Em entrevista ao Meio & Mensagem, Cecília comenta os aprendizados obtidos no evento, plano de ações que devem surgir a partir disso e expectativas para a volta para casa em todos os âmbitos de sua vida.
Meio & Mensagem – Essa é sua primeira vez no evento. Como estavam suas expectativas? Elas foram atendidas?
Cecília Alexandre – Foram, e acho que inclusive elas foram superadas. O que é muito engraçado é que eu estruturei três caminhos que eu queria fazer, sobre ESG, inteligência artificial, o mundo do metaverso. Eu também queria entender sobre um último ponto — que eu não consigo nem me lembrar porque eu não consegui cumprir. Eu escolhi realmente um caminho onde eu explorei muito sobre metaverso e sobre inteligência artificial. Ontem assisti uma sobre computação quântica, algo completamente diferente e que pode revolucionar. [O evento] foi muito rico porque eu vi de tudo. Por outro lado, eu também consegui aprender e ver outras coisas. Fui em uma palestra de psicodélicos, outra sobre o coeficiente de curiosidade. É uma enxurrada de informações que abre realmente a cabeça.
M&M – Muitos dos insights não são aplicados nos negócios, mas servem também para um engrandecimento pessoal. Como isso reflete no seu dia a dia como CMO?
Cecília – Nós somos uma pessoa só. Eu sei que tem a Ciça profissional, a Ciça mãe, mulher. Mas elas estão sempre juntas. Eu aproveito esses momentos para o engrandecimento das duas. Os aprendizados que eu levo daqui é de algo que eu já venho construindo sobre continuar com a minha cabeça aberta para aprender. Até foi sobre entender essa palestra sobre curiosidade: o quanto que eu sou aberta mesmo, e o quanto eu posso me abrir mais e ter diferentes pontos de vista. Como tudo, temos vivido em mundo tão polarizado e, cada vez mais, precisamos escutar as opiniões antes de tomar uma decisão. Eu participei de uma sessão de metaverso que falava justamente dos caminhos da jornada, consumidor e de uma estrutura. Uma outra falava que era preciso mais cuidado para não ocorrer o “metawashing” – expressão que eu achei incrível. Existem os dois contrapontos e qual é o insight que sai no final? No avião, dado que tem muitas horas, vou fazer um momento de download. Vou estruturar todas as anotações para que saiam com ações, mas não só necessariamente, pensamentos também. Quando voltamos para o lado pessoal, em um determinado momento pensei que não poderia fazer aquilo só para mim. Eu mandei uma mensagem para meus filhos dizendo que no primeiro ano de faculdade eles virão comigo, porque é uma experiência incrível.
M&M – Falamos de um mercado que espera uma possível recessão global. De que forma isso impacta nos negócios da Heinz, não só no Brasil?
Cecília – Já temos vivido muito isso nos últimos anos. Sabemos como o cenário das inflações, a dificuldade das commodities, o trânsito dos ingredientes, tudo isso já tem sido impactado. Se aqui [nos EUA] tem inflação, no Brasil também tem. O que precisamos é realmente construir algo em que a gente continue gerando valor para o consumidor, se diferenciando, porque não adianta de nada fazermos algo e que, depois, quando chega na ponta, ele não converte. O quanto conseguimos garantir essa experiência que se transforme em uma conversão? Esse vai ser o nosso maior desafio. Temos hoje em nosso portfólio três marcas que jogam em tiers diferentes, então isso auxilia um portfólio super complementar, mas que elas precisam crescer dentro dos seus espaços com suas propostas de valor. Estamos em um momento em que estamos olhando para o planejamento estratégico dos próximos anos e isso é muito pauta de discussão.
M&M – O SXSW vem discutindo muito o futuro dos alimentos e como eles podem contribuir para o bem estar do ser humano, bem como sua longevidade. Como Heinz olha para isso?
Cecília – Primeiro, Heinz já é feito com seis ingredientes naturais e só. Temos uma premissa, que é do Henry John Heinz desde sempre, que é fazer uma coisa simples de uma forma muito boa — “uncommonly well”. Esse é o propósito. É uma marca que se construiu falando sobre a qualidade superior para entregar o melhor para o consumidor. Isso está sempre na nossa pauta, em tudo que fazemos e como olhamos para os produtos lá na frente, já é inerente do que podemos pode fazer. Temos um lado sobre um portfolio, falando de Hemmer, que é super amplo onde as pessoas têm uma possibilidade de cozinhar muito, que também faz parte da saúde mental, porque é um momento onde você consegue se desconectar no dia a dia, despertar sua curiosidade, porque é possível fazer muita coisa. Então, as marcas têm propósitos diferentes e que conseguem atender às tendências. Tem uma tendência de mais naturalidade de ingredientes, outra sobre esse momento de prazer. Uma das coisas que eu percebi aqui é que a gente pode estar falando muito de techs, mas tem algo em todas as falas que são muito fortes. Uma é o quanto a percepção de tudo está sendo invadida e os consumidores sendo donos de seus próprios dados. Isso é fato. O outro que já acontece, mas em uma escala, é voltar para o básico, com a tecnologia como meio. Tem palestras como essa da computação quântica que às vezes dá um desespero sobre o que vai ser o mundo, porque é tão diferente, mas podemos pensar o que isso vai trazer de serviço e melhorar nosso trabalho. Precisamos desse download para entender e para tentar prever o que pode acontecer — e às vezes vamos errar — mas entender como trazemos isso para os nossos negócios e nos antecipar.
M&M – E em relação ao desperdício? O que você leva do SXSW? O CEO da Patagonia afirmou que perdemos o direito de sermos pessimistas em relação ao que acontece no mundo.
Cecília – Tem muita coisa. Se não fizermos nada para o nosso planeta, teremos um problema muito sério, e isso já temos falado há muito tempo. A Patagonia tem um modelo de negócios próprio, e funciona. Mas o que me faz pensar, cada vez mais voltando o olhar para nossa cadeia como um todo e como podemos utilizar isso. Temos projetos internacionais que ainda não podemos divulgar, mas que temos trabalhado com essa visão. A forma de comunicar não é mais aquela comunicação em que falamos só do benefício do produto, mas o que há de verdade por trás. Aí, eu volto aos bons e velhos 3Vs: verdade, velocidade e vivência. Mas, sobre a verdade, o que podemos fazer de forma consistente? Falei de metawashing antes, e existe o greenwashing. E é tudo o que não queremos. Existem vertentes muito claras. No caso de Quero, começamos um projeto em volta da nossa fábrica de Nerópolis (Goiás) em parceria com a Comida Invisível, em que temos um objetivo de ser uma cidade praticamente com fome zero. Temos feito ações dentro da cidade, em que falamos sobre e distribuição de alimentos, sim, mas também de educação. É um projeto que começou e vai crescer cada vez mais. Temos também todos os nossos KPIs de fábrica sobre as nossas preocupações, como consumo de água, redução da quantidade de lixo… tem toda uma preocupação dentro do nosso ecossistema com metas muito claras.
M&M – A Heinz conta com a The Kitchem, que materializa muito do que temos visto no festival sobre dados e cultura. Por que houve a necessidade de criar isso inhouse e o que é possível melhorar a partir dos insights obtidos no festival?
Cecília – O The Kitchen é um projeto que nasceu no Canadá e depois foi tomando conta do mundo. Ele nasceu muito para trazer criatividade e cultura na velocidade da vida das pessoas, estar dentro dessas conversas. Hoje, não fazemos sozinhos, temos a Soko conosco. Mas a partir do momento que detemos isso dentro de casa, começamos a ter uma rotina para muito mais velocidade. E também abrimos mão não da qualidade da execução, mas entramos em outros meios e formatos em que conseguimos ter mais atividade e testar mais. A comunicação como a gente fazia era fundamental, mas o consumidor evoluiu para uma conversa diária, e dessa forma conseguimos garantir uma linearidade de conversa com ele. Caso contrário, não conseguiríamos. O SXSW foi “mindblowing“. Na volta para casa, precisamos falar sobre dados, sobre metaverso, entender como construímos isso e como personalizamos as relações a partir de dados, dando o próximo passo. Faz parte de sair daqui não só com grandes temas, mas com propostas e um plano de ação. Do time de marketing, tem apenas uma pessoa aqui em Austin, além de mim. Seria muito egoísta levar tudo isso só para mim. Sendo realista, existem planos para agora, outros para daqui um ano. Mas, ao menos, é preciso ter bons pensamentos e direcionais.
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