Em tempos viscerais, treine sua mente a ver o melhor das pessoas
É sobre reconhecer os desafios, enfrentá-los com nossos valores e tentar encontrar a luz nesses momentos
É sobre reconhecer os desafios, enfrentá-los com nossos valores e tentar encontrar a luz nesses momentos
11 de março de 2023 - 11h42
A edição 2023 do South By começou com um chamado muito sensível e poderoso. Uma fala tão profunda que parece ter setado o mood do evento em torno de um forte sentimento de esperança — algo bastante necessário e valioso em nossos dias atuais.
Simran Jeet Singh é um educador, escritor e ativista americano. Ele fez uma fala contundente para tentarmos sempre enxergar o melhor das pessoas e da humanidade. E ele tem consciência do quanto isso é difícil, especialmente em meio aos tempos viscerais em que vivemos. E também por conviver desde cedo com um preconceito muito cruel em relação à religião e costumes da sua família, algo que sofre diariamente desde quando era uma criança.
Por diversos momentos da fala de Simran eu me emocionei e fiquei arrepiado com suas palavras sobre sua história. Tanto que fui depois na sua sessão de autógrafos para poder parabenizá-lo pessoalmente por sua fala contundente — e também para garantir um exemplar do seu livro autografado (Simran publicou “The Light We Give” em 2022).Ao falar para uma plateia de 2500 pessoas deixou todos em um silêncio absoluto para escutar cada detalhe da sua história. Começou contando que a primeira vez que alguém o chamou de terrorista foi quando ele tinha 11 anos de idade. Tudo aconteceu em um jogo de futebol na escola. Ele queria jogar com as outras crianças. O árbitro chegou para ele e apontando para o seu turbante disse que sabia como “a sua gente” costumava guardar bombas e facas “naquela coisa” e que ele precisava averiguar.
Simran contou que ele era apenas uma criança. E que queria muito jogar. Não tinha nenhum adulto por perto para ajudá-lo a entender o que estava acontecendo. E que então ele se abaixou e deixou o juiz conferir o seu turbante. Simran ficou remoendo essa situação por semanas. Ficou enlouquecido com aquele rapaz mas ficou ainda mais enlouquecido com ele mesmo. Até hoje fica evidente como se sente mal por toda essa situação — e por ter sucumbido a este preconceito, sendo exposto e subjugado dessa forma.
Simran contou alguns outros casos de racismo que viria a sofrer ao longo da vida — especialmente depois que personagens como Osama Bin Laden passaram a ser mais e mais expostos como únicos representantes midiatizados da sua imagem. E em como foi percebendo que quando as pessoas demonstravam esse tipo de preconceito em relação a ele, de certo modo, conseguiam moldar a sua própria noção de realidade sobre si mesmo. E assim deturpavam, pouco a pouco, a sua auto-estima de um modo bastante dolorido.
Mesmo com tudo isso, o mais legal na fala de Simran é a forma como ele consegue propor uma subversão de perspectiva. Em vez de se render a sentimentos rancorosos e raivosos, que inclusive seriam legítimos e compreensíveis dado tudo que ele passou, ele defende que a gente tente sempre nutrir sentimentos positivos e esperançosos em relação às outras pessoas. Defendeu que a gente se abra para elas, para que então elas se abram de volta para a gente. E isso não seria alguma forma de escapismo ou de positividade tóxica.
É sobre reconhecer os desafios, enfrentá-los com nossos valores e tentar encontrar a luz nesses momentos. Ele reconhece que a raiva e o ódio são sentimentos humanos. Que é impossível não senti-los. E, cá entre nós, temos muitas razões para sentirmos raiva hoje em dia. Mas Simran sugere que a gente tente educar o nosso cérebro a canalizar esses sentimentos negativos — e nocivos — numa direção que buscamos para nós mesmos, para a nossa família e para a nossa sociedade. Você precisa fazer uma escolha. E conclui afirmando que o amor é a fundação de toda justiça.
Simran é uma expressão que quer dizer “se recordar”. Em sânscrito, se refere à lembrança contínua e remanescente do aspecto mais sutil do “eu” profundo — e da nossa relação perene com Deus. De certo modo, é exatamente isso que Simran fez hoje e o faz em sua jornada como educador e autor: nos ajudou a lembrar, logo na abertura do SXSW 2023, de como é importante aplicarmos essa lente positiva em relação às pessoas, à sociedade e à nós mesmos de uma forma mais otimista, nos provocando a sempre procurar pela luz em tudo.
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