Giovanna, da Unilever: “Precisamos repensar os nossos modelos”
CMO de home care Américas da Unilever, Giovanna Bressane defende uma soma entre tecnologia e atenção às relações humanas para transformar o trabalho na era da IA
CMO de home care Américas da Unilever, Giovanna Bressane defende uma soma entre tecnologia e atenção às relações humanas para transformar o trabalho na era da IA
Taís Farias
15 de março de 2024 - 6h00
Pouco mais de um ano depois da explosão do ChatGPT e das conversas sobre a inteligência artificial, a empolgação tecnológica poderia ser o caminho mais previsível para o South by Southwest 2024. Mas não foi. Enquanto a tecnologia evolui em uma velocidade cada vez mais acelerada, o festival abriu espaço para pensar o que é ser humano e quais são suas dores.
O mesmo caminho foi feito pela CMO de home care Américas da Unilever, Giovanna Bressane. No seu segundo ano no festival, a executiva trocou as pautas clássicas sobre tecnologia para se aprofundar nas relações humanas e na interação homem e máquina. Em entrevista ao Meio & Mensagem, ela comenta o avanço da Creator Economy e como lidar com a insegurança no ambiente de trabalho à medida que a IA avança:
Meio & Mensagem – Hoje, qual o seu balanço sobre o SXSW 2024? Qual o principal destaque?
Giovanna Bressane – Se eu for citar uma coisa que me chamou atenção, neste ano, no festival, é o fator humano. A quantidade de trilhas que estão permeando essa temática do fator humano e da importância das relações, das conexões, da saúde mental, e qual o papel do ser humano nisso tudo. Eu acredito que isso tem muito a ver com as necessidades que a inteligência artificial e as tecnologias estão trazendo. Nós ficamos, muitas vezes, naquela discussão de o homem ou a inteligência artificial. Quem está na frente? Fica um versus o outro e até existe a pergunta: vai ter espaço para o homem? Para mim, nunca ficou tão claro o quanto tem esse espaço que é um espaço de protagonismo. É o espaço de colocar a tecnologia não só como algo a ser adotado, mas como algo que tenha uma finalidade, que consiga criar futuros possíveis, transformar negócios, transformar a sociedade e a forma como fazemos muitas coisas. Me trouxe muito essa consciência do potencial humano e da responsabilidade humana para fazer com que isso aconteça.
O evento vem discutindo questões como solidão, infelicidade e seu impacto para as marcas. De que forma isso reverbera no consumo doméstico?
Giovanna – Muitas vezes a infelicidade ou até a solidão, pode levar para dois extremos. Quando pensamos, por exemplo, no impacto das redes sociais nas meninas que estão crescendo com essas referências e inspirações das redes sociais, a marca Dove, da Unilever, tem esse papel de tentar quebrar esse viés e mostrar um outro lado. Muito mais sobre o bem-estar do que a vaidade e como essa menina pode encontrar esse equilíbrio e se fortalecer dentro da individualidade dela. Mas, quando eu penso na divisão de negócios que eu estou hoje de cuidados com a casa e com a roupa, a casa é um lugar que nós sabemos que tem muito significado para as pessoas. As pessoas têm na casa, muitas vezes, o espaço de segurança, o momento de estar com a família e o momento de conexão. Então, eu acho que a casa é um lugar que leva para esses relacionamentos mais cheios de significado, mais verdadeiro, de conexão de verdade. Eu vejo uma super oportunidade, como marca, de incentivar esse movimento. Colocar esse convite para as pessoas, porque esse é um aspecto. E, com relação ao consumo, é como nós podemos construir produtos e temáticas que ajudam as pessoas nesse sentido.
M&M – Pela primeira vez, o SXSW teve uma trilha focada na Creator Economy e Unilever tem desenvolvido uma série de projetos explorando esse pilar. Hoje, o que você ainda enxerga como um desafio na relação com os criadores e a influência? Que tendências você enxerga para o setor a partir do festival?
Giovanna – O fato de a Creator Economy ganhar uma trilha própria chancela que não é um side job. É uma realidade fortíssima e que vai muito além, hoje, da publicidade e da propaganda porque já movimenta outras indústrias. Algumas coisas que eu vi aqui foi olhar para os criadores de conteúdo, como verdadeiros produtores, de arte, entretenimento e, muitas vezes, de peças publicitárias, com uma qualidade de produção muito grande e isso conecta, automaticamente, com a indústria audiovisual. Se hoje nós estamos ainda nos ring lights ou smartphones que acabam tendo propriedades muito mais sofisticadas para que eles possam criar conteúdos, você vai para um outro extremo. Na palestra da Lisa Su, CEO da AMD, ela falou muito sobre o alto poder de computação, em um custo muito baixo, acessível a todos. Ela mesma colocou que isso vai de Hollywood até os criadores de conteúdo. Existem pessoas pensando essas tecnologias para tornar a produção de conteúdo muito mais rápida e com maior qualidade. Isso, para a Economia de Criadores, vai ser uma mudança extremamente importante e que vai dar mil possibilidades para que os criadores possam fazer mais do que eles já sabem fazer muito bem. Por outro lado, vão surgir temáticas como toda a questão da autenticidade de conteúdo, por exemplo. Questões éticas que todo mundo que trabalha com a Economia de Criadores vai ter que pensar sobre como fazer isso acontecer de uma forma responsável.
M&M – Enquanto liderança e soft skills, quais você considera os principais aprendizados do festival?
Giovanna – Eu enxergo alguns pontos. Primeiro, nós precisamos repensar os nossos modelos. É menos sobre ficar lutando contra e falando “Ai, agora, vai quebrar os modelos que tínhamos. Vai mudar tudo”, e tendo em vista que a tecnologia é um fato. É entender como ela pode ajudar a operarmos melhor, para que a gente tire o melhor da forma de trabalhar e para que tenhamos as pessoas fazendo o que elas fazem de melhor. Ver as pessoas no melhor delas. Eu acho, que quando as pessoas estão no melhor delas, você libera um potencial incrível na organização. Então, como é que nós usamos essas ferramentas tecnológicas para permitir que as pessoas façam trabalhos onde elas vejam o valor que estão agregando.
M&M – Em seu painel, Amy Webb falou sobre como a IA e as transformações tecnológicas colocaram os líderes em um momento de Fud (medo, incerteza e dúvida). Como isso se aplica aos líderes brasileiros? Você vê um paralelo?
Giovanna – Existe, sim, muita dúvida e muitas vezes isso está atrelado ao fato de que, naturalmente, quando a tecnologia escala você vai ter algumas perdas de funções. Você vai ter, muitas vezes, mudanças em modelos de negócio. Se você for pensar, podem surgir startups que vão substituindo empresas existentes pela forma como conseguem usar a tecnologia e as outras empresas passam a perder um pouco da sua funcionalidade. Então, algumas perdas, certamente, vão ter. Mas, eu acho que passa por, de novo, nós entendermos a tecnologia a fundo, criar repertório, olhar todas as possibilidades que ela oferece e canalizar. Acho que tem um caminho muito grande para evoluir mesmo. Mesmo na web 3.0, já não está tudo super claro sobre o que é correto e o que não é. Tem avanços que são necessários. Quem dirá sobre a inteligência artificial. Tem ainda uma necessidade grande de regulamentação. Mas eu acredito que se a gente se aprofundar e for conhecer quais são as possibilidades e limitações, os riscos e tentarmos trabalhar para tirar o melhor disso, conectando a tecnologia com o fator humano, vamos conseguir resolver.
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