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De 7 a 15 de março de 2025 I Austin - EUA
SXSW

Há luz no fim do túnel para os games, segundo Joost Van Dreunen

Apesar de desafios, como a baixa nos investimentos e saturação de conteúdo, o professor da NYU enxerga um futuro promissor para a indústria, baseado em “low tech”, “low grow” e “low cost”


13 de março de 2025 - 14h42

Como de costume há cinco anos, o professor da NYU, Joost Van Dreunen, trouxe ao South by Southwest um panorama da indústria de games. O início de sua apresentação foi um tanto negativa, com o professor pontuando fatos, como o declínio pelo qual o setor tem passado, versus seu crescimento acentuado anos antes. Entretanto, ao longo da sessão, ele trouxe motivos para acreditar que ainda há esperança para essa indústria.

games dreunen

Joost Van Dreunen, professor da NYU, apresenta panorama do mercado de games no palco do SXSW (Crédito: Amanda Schnaider)

Mas antes de entrar de fato no assunto, em linha com um tópico que perpassa todo o festival, que é a conexão, Dreunen compartilhou com os presentes um conselho que dá aos seus alunos. “Faça amigos hoje”, disse. “Encontre essa conexão, que eu acredito ser mais crítica do que nunca hoje em dia”, complementou.

Ao longo de sua apresentação, o professor revelou que o mercado atual de games é fruto de uma combinação entre desafios e oportunidades, mas que a narrativa que está sendo vendida é que o setor está fadado à morte. “A indústria de jogos está sob essa ameaça constante por parte de investidores, acionistas, analistas e uma infinidade de outras empresas que dirão: ‘Ah, é uma moda, agora está morto, acabou’”, frisou.

Para explicar o que vem acontecendo com esse mercado, Dreunen começou destacando que essa indústria passou por um período de 20 anos de crescimento “espetacular”, mas que, nos últimos anos, de fato, houve algum declínio. No entanto, ressaltou que essa queda não é de se preocupar, uma vez que o crescimento foi de cerca de 700% e o declínio de 7% nos últimos três anos.

Desafios do setor

Apesar disso, ele destacou que algumas falhas têm se tornado públicas e realmente “dolorosas” para a indústria. Um exemplo disso são lançamentos que fracassaram, como Concord, jogo da Sony retirado do ar duas semanas após seu lançamento, ocasionando a demissão de toda a equipe. “É um momento catastrófico, que define o tom para partes da indústria”, ressaltou Dreunen.

Outro desafio que a indústria está enfrentando neste momento é aumento dos custos de desenvolvimento e promoção dos jogos. Segundo o professor, tudo isso tem relação com a abundância de conteúdo.

Pela maioria das publicadoras de games serem de capital aberto, os investidores e acionistas, ao perceberem que um título não deu certo assumem que a publicadora está fraca. “Com algumas exceções, você vê que as empresas de jogos estão tendo dificuldades”, complementou.

Com a baixa nos investimentos, a consequência é uma onda de demissões, reestruturações nas empresas de games, gerando ainda um impacto negativo na criatividade. “No geral, muitas das empresas têm recuado, têm retirado investimentos da mesa. Isso tem um impacto amplamente negativo no ecossistema geral”, frisou. “Isso seca a capacidade da indústria de inovar para alimentar e financiar novas ideias”.

Como resultado desse movimento, Dreunen observou que a estratégia difundida no mercado atualmente é que grandes empresas estão pegando o capital que lhes resta e, ao invés de investirem em marketing direto e contratação de pessoas, estão adquirindo companhias que parecem estar se bem e que são semelhantes aos seus próprios negócios. “Assim, vemos a Playtika comprando uma empresa chamada Superplay, de jogos mobile estilo cassino”, exemplificou. O professor ressaltou que a indústria está se consolidando por meio dessas aquisições.

Focar em um único grupo demográfico, sem considerar a diversidade de jogadores, tem sido um erro comum na indústria, segundo Dreunen. O professor usou o exemplo de Roblox, que luta para sobreviver enquanto vê sua base de usuários envelhecendo. “Talvez haja um grupo demográfico mais amplo ao qual possamos apelar do que apenas crianças”, alertou.

Apesar de ser vendida como o futuro dos games, Dreunen destacou que a realidade virtual (VR) ainda não se provou como um negócio sustentável, uma vez que os óculos e headsets não tiveram apelo massivo. “Não está realmente quebrando nenhum tipo de nova marca disruptiva”, completou. Ele, inclusive, ironizou os novos óculos da Meta em parceria com a Ray-Ban. “É claro que Mark já percebeu que não é para ser esse gadget nerd. Tem que ser essa coisa de moda. Você tem que torná-lo aspiracional”.

O metaverso e a Web3 também foram apontadas como tecnologias que tiveram um hype muito grande, mas que não apresentaram, de fato, uma disrupção. “A ambição é sempre uma coisa e a realidade, o produto final, é sempre outra coisa”, enfatizou.

Esperança no futuro

Apesar todas essas dificuldades enfrentadas pelo setor de games, Dreunen enxerga com bons olhos o seu futuro. “A próxima década nos jogos não será mais de miséria. Acredito que a história está chegando a um momento de transição. Está evoluindo para sua próxima etapa. Está evoluindo para sua próxima era de distribuição”, frisou.

Os primeiros indícios disso, segundo o professor, são outras indústrias, como a do cinema, explorando as propriedades intelectuais dos jogos. Ele usou o filme do Mario, que arrecadou cerca de US$ 1,3 bilhão, segunda maior bilheteria de animação da história, atrás apenas de Frozen 2, para exemplificar seu ponto. “A Nintendo sabe exatamente o que as pessoas vão assistir”.

Dreunen também vislumbrou o potencial de receitas publicitárias nos jogos. O surgimento de empresas não-endêmicas à indústria dos jogos interessadas nesse mercado foi notado pelo professor. “Essas empresas não fazem jogos de fato. Elas percebem que o jogo é uma peça incrível do pipeline. É assim que atraem usuários, é assim que convencem assinantes e acessam um público muito mais amplo e muito mais engajado, que talvez esteja cansado dos canais tradicionais e talvez um pouco saturado das mídias sociais”, reforçou.

Ao final de sua apresentação, Dreunen desafia a narrativa do declínio da indústria de jogos, expressando otimismo sobre o seu futuro. Futuro este para o qual propôs uma abordagem com base em três fatores: low tech (baixa tecnologia), low grow (baixo nível), low cost (baixo custo). Em meio a saturação tecnológica – tópico bastante presente por toda a programação do SXSW 2025 – experiências que necessitem de menos tecnologia e que sejam mais acessíveis podem ganhar destaque, segundo Dreunen.

Dentro desse conceito “low tech”, o professor enfatizou alguns exemplos, como os jogos de tabuleiro e o pickeball. Já o “low grow” diz respeito garantir uma audiência mais ampla, versus o consumo elitista dos games. E o “low cost” se baseia no conceito de que não é preciso de um grande orçamento para uma grande ideia nascer e florescer na indústria dos jogos.

Ao longo de sua apresentação, Dreunen deu alfinetadas em grandes executivos que prometem transformar o mundo com suas grandes e caras tecnologias, como Mark Zuckerberg e Elon Musk. Mas, antes de se despedir da plateia, o professor ainda deixou um recado ao dono do X. “Elon é um idiota. Eu não preciso que ele faça jogos ótimos, jogos sempre foram ótimos”.

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