19 de março de 2024 - 16h20
Entre acreditar cegamente ou questionar duramente, nós sempre preferimos a segunda opção. Talvez seja por isso que o SXSW prometia ser uma grande experiência pra mim, que nunca havia estado aqui antes.
Chegar em Austin durante o evento é como visitar uma cidade em clima de festa, onde a vida local se mistura com a chegada dos mais diversos tipos de pessoas do mundo. O que leva essa cidade a ser um polo de pensamento no mundo? O que faz você andar pelas ruas e cruzar amazonas de biquínis sobre seus cavalos? O que leva uma cidade como está ser um bicho tão estranho? Talvez poucas destas respostas sejam exatas, mas muitas delas merecem ser refletidas.
Refletir e questionar, o mais agnóstico dos mantras, me colocou em painéis inspiradores, com dezenas de horas de debate sobre Inteligência Artificial (IA) e o futuro da sua tecnologia generativa, mas aqui prefiro deixar os experts debater mais. Talvez a IA não consiga descrever o que é ver a terra de longe, lá do espaço, como fizeram de maneira as poderosas mulheres da Nasa ao descreverem como tem sido suas rotinas em uma cápsula orbitando pelo espaço. É tão incrível como elas lá foram ver o palco aqui na terra também sendo conduzido por mulheres.
A delegação feminina em Austin foi significativa e enche de orgulho ver tanta mulher representando em conversas, networking e pelas ruas. Mas confesso que fiquei muito frustrada em ver tão poucas de nós em seminários sobre o futuro da IA, não pensando apenas no palco do SXSW de 2024, mas por sinalizar que a interferência dos humanos ao programarem seus prompts e inteligências tende a seguir vieses tortos e pouco diversos.
Há o risco grande de reduzirmos os questionamentos e voltarmos aos padrões que levaram décadas para serem debatidos e agora quebrados. Por isso, preparar o futuro é determinante para fazer diferente.
E tem mais um ponto: sim, sabemos que a tecnologia avança a cada dia, ocupa espaços, tira empregos, transforma indústrias. É difícil não se encantar por tantas soluções tecnológicas apresentadas nas feiras e nos pitchs que rolam durante o festival. Mas eu não sei se algum dia vai ser possível a tecnologia ocupar o lugar da arte. Ela até pode fazer os seus beats, músicas e composições, mas eu questiono muito se ela seria capaz de fazer o que o Marcelo D2 fez em uma noite em Austin. É outra natureza. Ou que o Tico Canato fez na minha jaqueta em um fim de tarde na Casa Sao Paulo.
Por falar em natureza, o que seria então o papel de um painel falando sobre psicodélicos da floresta amazônica? Quem diria que o tratamento de câncer pudesse ver sua dor atenuada com ensinamentos naturais. Só quem já esteve tão perto desta doença sabe o quão emocionante é escutar relatos positivos de tratamento. De que adianta a gente conseguir fazer uma live real time do espaço se ainda morremos por uma doença que nos consome aos poucos e a cada dia um pouco?
Encerro minha participação com ainda mais perguntas do que respostas. Ainda mais agnóstica aos temas e questionadora de tantas certezas que costumam falar por festivais. Mas, sim, para ter pelo menos uma certeza aqui, eu posso dizer que estar no SXSW deve ser passagem obrigatória para todo mundo que ousa se questionar. E pra provar que nem tudo é só palestra e papo cabeça, sugiro que estando em Austin você invista seu tempo no Austin Duck Adventures, um passeio pela cidade que termina no Rio Colorado com o ônibus dentro da água. Tão importante quanto ser “cabeção” e discutir o futuro do AI é saber curtir um city tour assoprando um apito de pato. Quack Quack.