Clima e cultura de consumo: pequenas ações, grandes movimentos
Soluções concretas para o combate de mudanças climáticas parte de grupos menores e depende em grande parte da informação, mas ainda esbarra em falta de diversidade
Soluções concretas para o combate de mudanças climáticas parte de grupos menores e depende em grande parte da informação, mas ainda esbarra em falta de diversidade
Giovana Oréfice
13 de março de 2023 - 20h27
Como não lembrar do movimento anti-canudos de plástico que assolou a mente dos consumidores em prol da vida marinha? Algo tão amplo não poderia partir de uma única mente – e essa afirmação é uma mentira. Ou até mesmo quando aconteceu uma espécie de pacto social da interrupção do uso de desodorantes aerossóis para salvar a camada de ozônio. O que o meio-ambiente leva disso tudo?
Tais movimentações foram oriundas de inúmeras manifestações individuais que são capazes de mover montanhas, ou, melhor dizendo, mover marcas e indústrias. “Outras pessoas veem o que fazemos individualmente, e isso tem o poder de ser incrivelmente influente, o que é importante lembrar e se capacitar por si só”, pontuou Ashlee Piper, estrategista política, autora e expert em sustentabilidade. Ela foi uma das convidadas do painel Climate Crisis vs. Consumer Culture: How We Shift.
Há uma demanda clara vinda da sociedade nos últimos tempos. Amy Davis, da Cummins Inc, declarou que “consumer voice matters”. Como ilustração, consumidores estão pedindo que, cada vez mais, carros de entregas de grandes nomes, como a Amazon, sejam elétricos. O exemplo mostra um contraponto interessante de que, ao mesmo tempo em que o consumo vem aumentando (vide o crescimento no e-commerce durante a pandemia), há uma preocupação de, em certo ponto, algo de bom esteja sendo feito para minimizar seus impactos.
Um ponto abordado durante a conversa foi o consumismo, que segundo os palestrantes, tornou-se algo “patriótico” quando se fala de Estados Unidos. Quase como um ciclo vicioso, o consumismo exagerado vem sendo muito alimentado pelo marketing que tem os conhecimentos da ciência comportamental e hábitos de compra. Além disso, o consumismo vem inserindo-se na era da cultura digital, em que os indivíduos são induzidos a comprar para sentir pertencimento em determinados grupos, levando à superprodução.
Quando isso é colocado em larga escala os esforços aumentam, uma vez que há uma missão de colocar não apenas os consumidores na conversa, mas também os stakeholders. Mark Newton, head de sustentabilidade corporativa da Samsumg Electronics para a América do Norte, delineou que é importante que empresas tenham metas relacionadas à redução – ou até mesmo a eliminação – dos impactos causados ao planeta. Mas, mais do que isso, é necessário comunicar os consumidores do que está sendo feito.
Pode-se dizer que, atualmente, vivemos em uma via de mão dupla: ao mesmo tempo em que é fácil ter o feedback do consumidor, deve ser igualmente fácil fazer com que a informação chegue até ele. “Temos que humanizar essas mensagens”, declarou Newton, que também salientou que companhias devem usar sua voz e influência em prol da temática. “Uma das coisas que temos aprendido em termos de como fazer uma comunicação mais efetiva, é falar mais sobre como estamos realizando algumas das ações, não apenas que estamos incorporando 30% de material reciclado em nossos fones de ouvido”, exemplificou o head da Samsung.
Além disso, o mundo encara hoje a chamada “climate anxiety” (“ansiedade climática”), que é mais presente ainda na Geração Z. Contudo, não é possível esperar passivamente pela manifestação da sociedade. Também é dever das companhias alarmarem para resolver um problema que, em boa parte, é delas próprias a responsabilidade de atuar em uma solução: “Os millennials e as gerações mais novas realmente querem empresas que os façam sentir humanos. Eles querem responsabilizar as empresas pelo que elas vêm fazendo”, corroborou Ashlee.
No geral, são as novas gerações as responsáveis por acender o alerta sobre a urgência das ações. Contudo, há um outro lado da moeda. Apesar do alarme sobre mudanças climáticas, pouco se fala sobre o que, efetivamente, é possível fazer para evitá-las. Pergunte às crianças o nome de cinco marcas pelos seus logotipos, e elas te dirão quais são. Agora, faça-as nomear plantas a partir de imagens, e verá que é aí que mora o problema. O simples exercício foi proposto por Isaias Hernández, educador ambiental e dono do perfil @QueerBrownVegan.
Vale ressaltar que, mesmo que esteja sendo amplamente difundida nos últimos anos, a conversa continua sendo pouco inclusiva. O painel “How Climate Storytelling Can Beat Climate Doom” levantou o questionamento de que não podemos falar sobre a temática sem envolver questões de raça e de ancestralidade.
Esta última foi classificada por Diandra Marizet, diretora executiva da Intersectional Environmentalist, como uma peça que ainda falta no quebra-cabeça enigmático da busca por soluções neste novo mundo. Ela delineou que, um dos primeiros a falar sobre o assunto foram autores negros e indígenas, que escrevem desde os primórdios sobre a relação dos seres humanos com a Terra. O questionamento pode ser trazido para o presente: quantos ativistas, defensores do clima e ecologistas negros conhecemos?
“Há uma narrativa sobre a dualidade do clima em uma premissa que mostra a situação de uma maneira perigosa, pela qual as pessoas podem realmente espalhar desinformação”, declarou Hernandez. A questão perpassa ainda pelas injustiças de oportunidades de acesso à educação que grupos minorizados enfrentam. O debate instiga o protagonismo desses indivíduos no que diz respeito à ações de proteção à atmosfera, meio ambiente etc, uma vez que a oportunidade leva a repertórios, que dão espaço à criatividade.
Mais do que papel das marcas e da publicidade em espalhar a mensagem, aí entra o embate do papel das mídias tradicionais. No geral, a informação que temos em mãos são otimistas, mas ainda não cumprem muito do papel educativo que deve chegar a todas as camadas da população. “Acho super importante que as pessoas realmente apoiem a mídia independente e os jovens ambientalistas, tentando realmente navegar nesses espaços e entender o movimento dominante, o movimento populista”, acrescentou o educador.
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