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De 7 a 15 de março de 2025 I Austin - EUA
SXSW

Nenhuma tecnologia supera o fator humano

Em um mundo onde a tecnologia facilita cada vez mais nossa vida e a inteligência artificial chega a tomar decisões pelas pessoas, é bom perceber que ainda existe espaço para discutirmos a importância do prazer sensorial


20 de março de 2024 - 16h54

Você já deve ter lido ou ouvido muito das pessoas que, assim como eu, estiveram no SXSW 2024, que o tema fator humano foi bastante debatido por lá. Foram várias as oportunidades em que essa discussão ganhou espaço, por isso eu quero trazer minhas lentes para esta perspectiva: a relação entre a alimentação e as conexões humanas.

Entre as palestras que assisti, algumas com temas que me geraram grandes expectativas, como o desperdício de alimentos, acabaram sendo só um lobby das empresas patrocinadoras, por isso não agregaram tanto. Por outro lado, algumas apresentações foram gratas surpresas e trouxeram conteúdos novos inesperados. Na minha área de atuação, seguindo a trilha Alimentos do SXSW, uma das que eu achei mais interessante e que levanta essa questão do lado humano foi a sessão da premiada jornalista Mary Beth Albright: “Comida, Prazer e Bem-Estar Emocional”. Durante sua apresentação, ela enfatizou que está havendo uma recuperação da positividade alimentar e do bem-estar emocional na cultura da dieta, sugerindo uma mudança para desfrutar e preparar mais os alimentos, o que traz uma relação completamente diferente com a comida, muito mais prazerosa. Ela também mencionou que há várias maneiras sensoriais de aumentar o prazer alimentar e que existe uma preocupação das empresas de alimentos em se adaptarem para atender as tendências de consumo.

Para mim, a comida tem um papel essencial na criação da conexão emocional, e o prazer de comer e de compartilhar refeições é uma maneira muito eficiente de construir relações humanas sólidas.

Nessa linha, outra apresentação que me impactou demais foi o bate-papo entre duas das grandes pensadoras contemporâneas sobre relações humanas: Brené Brown e Esther Perel. O encontro levantou um questionamento sobre como as conexões virtuais podem criar uma sensação de pseudoexperiências, parecendo reais, mas, em última análise, fazendo os indivíduos se sentirem desconectados e solitários. É curioso pensar que, como apontaram as palestrantes, a tecnologia moderna, representada especialmente pelos smartphones e pelas mídias sociais, pode atuar como uma barreira para conexão e presença genuínas. Se não tomamos cuidado, o que poderia ser um fator para nos aproximar acaba nos isolando e nos fazendo perder a conexão com quem está ao nosso redor. Isso acontece quando damos mais atenção às telas do que às nossas companhias em uma mesa, por exemplo. Nós precisamos praticar a atenção plena, a escuta profunda e valorizar as experiências, porque só assim haverá conexão emocional e relações humanas verdadeiras.

Brené contou que estava com a filha em um restaurante, conversando com as pessoas da mesa ao lado e quando a comida chegou, a mulher com quem ela falava, imediatamente, disse para o companheiro: “Pare! Uma foto primeiro!”. Quem nunca vivenciou isso?! Após o acontecido, a pesquisadora se questionou: será que a refeição não existiria se eles não a fotografassem? O importante não deveria ser se a comida é boa, algo que não é possível julgar pela foto?

Em um mundo onde a tecnologia facilita cada vez mais nossa vida e a inteligência artificial chega a tomar decisões pelas pessoas, é bom perceber que ainda existe espaço para discutirmos a importância do prazer sensorial. E são essas sensações que nos fazem ser parte desse grupo tão heterogêneo e fascinante que é a raça humana.

Gostei muito de ver que um festival futurista, no qual se discute as tendências de inteligência artificial e muitas outras inovações, tenha espaço para temas menos técnicos, como a conexão emocional, as relações humanas, as experiências sensoriais e o prazer. Saí de lá com a convicção de que nenhuma tecnologia é capaz de substituir o fator humano.

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