O quão weird o SXSW ainda consegue ser?
Tornar o caos do mundo aqui fora mais presente em Austin, para que a gente não se esqueça que não precisamos tentar prever o futuro, mas lutar para que ele continue existindo
Tornar o caos do mundo aqui fora mais presente em Austin, para que a gente não se esqueça que não precisamos tentar prever o futuro, mas lutar para que ele continue existindo
27 de fevereiro de 2025 - 16h28
Vou embarcar para meu primeiro SXSW em um mundo tomado pelo caos. E não consigo parar de pensar que vou chegar a um dos maiores festivais de cultura, artes e inovação do mundo enquanto acontecem guerras, extremismos políticos e uma gigantesca crise climática. Isso tudo ao mesmo tempo em que o conservadorismo toma outras proporções e a intolerância cresce à medida que as visões de mundo se estreitam e se voltam para o passado.
Sei que nos últimos anos o SXSW esteve muito focado nas tecnologias que moldam o futuro. E, enquanto me preparava para o evento, notei que o que menos me interessa são as conversas sobre tecnologias disruptivas ou sobre as máquinas que vão transformar completamente o jeito de viver. O papo sobre inteligência artificial, inclusive, já ficou até batido. E isso tem um motivo: a visão da tecnologia disruptiva já não gera mais estranheza em Austin, porque ela se tornou o padrão do festival.
Mas estamos falando de um evento que tem a expressão “keep it weird” como lema e não podemos aceitar que o South By vire apenas mais um evento utilizado em viagens de incentivo pelas empresas. O coração do SXSW sempre foi ser esquisito e trazer incômodo nas provocações. Isso não é à toa: não há outra forma de inovar e transformar o mundo que não seja olhando para a vida pelas lentes daquilo que é estranho e diferente.
A verdade é que estamos vivendo, todos nós, em uma espécie de scroll infinito. Tenho a sensação de que o tecido social que nos une está se rompendo – e não é por conta da tecnologia. É porque a gente se afastou dos valores cotidianos da generosidade e da arte. É porque a criatividade virou sinônimo de disrupção quando, na verdade, deveria estar em cada pequena coisa do nosso dia a dia.
E o mais assustador é que agora que temos todas as possibilidades do mundo de fazer escolhas diferentes – inclusive por conta da tecnologia – estamos escolhendo os caminhos mais convencionais, tradicionais e fáceis para viver. O que eu percebo quando olho para todo esse caos é que estamos sendo, cada vez mais, menos “weird”. E perder esse olhar de estranheza pelo mundo nos torna indiferentes, incapazes de imaginar qualquer realidade que exista para além das nossas próprias vidas. Perder o estranhamento pela vida é também o que nos faz perder o amor pelo mundo.
Por isso, para essa minha primeira ida ao evento, me preocupo mais com o que as pessoas vão levar na mala para Austin, do que com o que elas vão trazer de lá. Não podemos deixar que o SXSW seja um óasis no meio do deserto. Ouço muita gente dizendo que, quando se está lá, o mundo inteiro desaparece. Mas o que eu levo de expectativa é justamente o contrário: tornar o caos do mundo aqui fora mais presente em Austin, para que a gente não se esqueça que não precisamos tentar prever o futuro, mas lutar para que ele continue existindo.
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