7 de março de 2024 - 14h48
No ano passado, quando estive no SXSW para fazer uma palestra e mergulhar também como visitante naquele fascinante espaço de inovação e prévias de futuro, uma das apresentações que mais me impactou foi a de William Hurley, uma das referências em computação quântica e fundador da Strangeworks, startup focada nessa tecnologia. Segundo ele, nos próximos sete anos teríamos transformações maiores e mais impactantes que as vistas até hoje em toda a história da humanidade. Como um sinal ilustrativo dessas mudanças, Hurley encerrou sua palestra informando ao público que aquele conteúdo armazenado em seu tablet para a apresentação fora produzido na noite anterior pelo ChatGPT com base em informações de seu blog.
Naquele início de 2023, esse e outros chatbots do tipo começavam a se popularizar e era um frisson falar de inteligência artificial generativa. Um ano depois, isso não é mais novidade. Novidade mesmo são as discussões sobre como a ferramenta vem sendo incorporada em diversos setores, inclusive na saúde. E não há dúvidas de que a IA generativa, junto com as demais tecnologias digitais e os avanços na computação quântica, nos levará às tais transformações profundas e radicais das predições de Hurley.
Mas, trazendo para o setor no qual atuo, do último SXSW para cá, vimos um salto no desenvolvimento e na aplicação da ferramenta para levar acesso, reduzir custos e ganhar produtividade. Em resumo, a tecnologia pode nos permitir viajar na velocidade da luz rumo àquele que deveria ser um propósito universal: promover a equidade em saúde.
Muita coisa já vem acontecendo nesse sentido. Sistemas de IA analisam exames de imagem colhidos em unidades do SUS de qualquer lugar do país, auxiliando na indicação do diagnóstico; técnicas de big data e analytics ajudam a descobrir características de saúde de determinada população para orientar políticas públicas ou permitem avaliar e identificar formas mais eficientes de combater infecções por superbactérias em UTIs de hospitais públicos e outros menos estruturados; a IA generativa já começa a ser uma aliada de médicos generalistas em atendimentos que requerem conhecimentos mais específicos… Essas são algumas das dezenas de iniciativas lideradas pelo Einstein, cinco das quais apresentadas na edição anterior do festival. Mas, no Brasil e no mundo, existem inúmeras outras injetando tecnologia na saúde para melhorar a assistência, a prevenção de doenças, a gestão e produtividade das organizações, a segurança dos pacientes, a formação e o aprimoramento dos profissionais, entre outros aspectos.
Uma face importante na jornada tecnológica para impulsionar a equidade e os avanços em saúde está relacionada com pesquisa e inovação – campos que podem ser intensamente turbinados com a colaboração entre organizações de diferentes países, como a realização de ensaios clínicos descentralizados, capazes de fornecer dados de pacientes geográfica e etnicamente diversificados. É imenso o potencial de progressos e descobertas que podemos obter com organizações atuando em projetos colaborativos utilizando tecnologia. A inclusão de grupos de pessoas que muitas vezes ficam à margem dos estudos e do desenvolvimento de algoritmos é fundamental para que pesquisadores, desenvolvedores e analistas de dados possam construir modelos digitais voltados aos cuidados médicos mais precisos e imparciais.
Tudo isso é fonte de geração de conhecimentos e inovações para responder aos grandes desafios de saúde globais ligados às desigualdades de acesso e padrões de cuidado, ao envelhecimento da população (com aumento das doenças crônicas), à ameaça de novas epidemias e aos impactos das mudanças climáticas na saúde.
Como podemos alavancar a colaboração entre organizações de saúde e extrair o valioso potencial dessa abordagem que soma esforços para multiplicar resultados? Como orquestrar ecossistemas de saúde locais e globais e conectar startups para criar inovações que tenham mais escalabilidade? Que experiências já temos e que caminhos podemos trilhar para acelerar essa jornada? Reflexões e algumas respostas a essas perguntas deverão emergir durante o SXSW 2024 no painel “Collaborative Tech & Data Projects for Health Equity”. Liderado pelo Einstein, ele reunirá executivos de três dos mais importantes players globais de saúde: Mayo Clinic (EUA), City of Hope (EUA) e Sheba Medical Center (Israel). As três organizações – que já são nossas parcerias em diferentes projetos, muitos envolvendo big data, estudos descentralizados e pesquisa de mundo real, – abraçaram com entusiasmo a ideia de levar o tema ao maior evento de inovação e tecnologia do mundo.
Estou entusiasmado não apenas com o nosso painel, mas também com as descobertas que certamente farei acompanhando outras apresentações ou nas oportunidades de network que aquele ambiente do evento propicia. Mais do que isso. Ao reunir uma ampla comunidade global que pensa e produz inovações, o festival torna-se um caldeirão de reflexões sobre como as questões em pauta afetam a vida de todos, seja no trabalho, nas relações ou no comportamento humano. Eu não sei que novidades nas mais diversas áreas de estudos e atividades teremos neste ano. Mas sei que veremos novos passos sendo dados rumo às imensas e disruptivas transformações apontadas na ‘profecia’ de William Hurley. E sei que a saúde, permeada de mais equidade, fará parte delas.