DE 08 A 16 DE MARÇO DE 2024 | AUSTIN - EUA

SXSW

SXSW: oito anos depois

Estive no SXSW pela primeira vez em 2014. Retornei no ano seguinte. E agora, oito anos depois, volto a Austin e à loucura do maior festival de inovação digital do planeta


9 de março de 2023 - 10h40

(crédito: Amy E. Price/GettyImages)

Estive no SXSW pela primeira vez em 2014. Retornei no ano seguinte. E agora, oito anos depois, volto a Austin e à loucura do maior festival de inovação digital do planeta. Fiquei refletindo sobre essas primeiras experiências, tentando traçar paralelos com a edição deste ano, a primeira “sem restrições” pós-pandemia. Algumas coisas se mantêm, na minha visão.

A primeira é o caráter superlativo do SXSW: centenas de sessões, dezenas de milhares de participantes, uma miríade de temas sobre o presente e os prováveis futuros. Além disso, continuamos tendo (felizmente) uma lista interminável de ativações, happy hours, shows e festas, que desafiam as orientações de qualquer nutricionista. E há boas novidades também: as filas intermináveis e os recordes diários de passos prometem ser amenizados, com inovações introduzidas nesses últimos anos, como o SXXpress (“fura-fila”) e os apps de patinetes que, ao contrário do Brasil, resistem bravamente por lá.

Revendo minhas fotos e anotações das edições passadas, consigo identificar alguns temas que, naquele momento, ocuparam um bom espaço na minha agenda e na de vários outros participantes. Um exemplo são os wearables. Foram dezenas de sessões sobre beacons, sensores, gadgets e o quanto isso iria transformar, profundamente, a vida e as interações das pessoas com as marcas. Basta lembrar que o Apple Watch, talvez o principal produto desse tipo, foi lançado em 2015.

A promessa era estender a capacidade e os sentidos humanos através dessas tecnologias, nos dando experiências aprimoradas e misturando o mundo real e o digital. Se a tendência dos dispositivos vestíveis não se materializou na intensidade e escala previstas naquela época (foi mal, Google Glass), hoje vemos parte dessa mesma promessa, de uma fusão aprimorada de realidades, na discussão sobre metaverso. Passado o entusiasmo alucinante do ano passado, vai ser interessante capturar o entendimento atual, mais pragmático, de como esse tema poderá aterrissar (ou não) na nossa vida cotidiana nos próximos anos.

Outro assunto que dominava várias discussões anos atrás era o big data, com suas possibilidades, desafios e dilemas éticos. As plataformas de computação em nuvem estavam ganhando o jogo, e a Internet das Coisas (IoT) e as redes sociais prometiam uma avalanche de dados. Com isso, marcas, empresas e governos se entusiasmavam e se preocupavam, em igual medida, com sua aplicação.

Agora, em 2023, vejo o mesmo nível de emoções conflitantes em torno do grande assunto do momento: a Inteligência Artificial (IA). O SXSW acontece no meio do tsunami causado pelo ChatGPT e soluções correlatas. As diversas palestras sobre o tema, inclusive a que trará o CEO da OpenAI (proprietária do ChatGPT) para o palco, prometem ser as mais concorridas e com os debates mais acalorados. Como sempre acontece quando se fala dessas tecnologias de potencial exponencial, há um dualismo, muitas vezes fatalista, de opiniões. É muito provável que, a exemplo das previsões sobre big data, feitas anos atrás, estejamos metade certos e metade errados. O problema é que só saberemos distinguir entre esses dois extremos no futuro, olhando em retrospecto.

Esse ano, também estará em discussão um tema que, em 2015, não teve destaque. E não estou falando da cannabis e sua indústria — que, a propósito, é uma das trilhas do evento. Me refiro ao futuro do trabalho. É impossível ir ao SXSW 2023 e não se envolver nas discussões e sessões sobre o assunto. O debate sobre o formato híbrido, impulsionado pela pandemia, continua bastante ativo e atual. Os impactos dessa transformação, tanto na cultura corporativa quanto na forma como as pessoas passam a vivenciar e (re)significar sua relação com o trabalho, ainda não estão totalmente definidas. Mas, se esse tema, por si só, já merecia destaque nesta edição do evento, o fenômeno da IA conseguiu aumentar exponencialmente sua relevância. Afinal, todos queremos saber como isso pode não só impactar, mas transformar totalmente nossa carreira e a dos nossos filhos. Nessa relação entre a máquina e o homem, quem estará no controle de quem no futuro?

No fim, entendo que uma característica fundamental do SXSW também se manteve nesse intervalo de tempo que me separa das minhas primeiras jornadas ao evento. Ele continua sendo um dos melhores prismas imperfeitos para entendimento do mundo. Prisma, porque nas suas várias trilhas e sessões vai nos dando elementos que nos permitem ora decompor, ora integrar diferentes temas e ângulos e, com isso, nos fazer enxergar as ricas e complexas intersecções entre os avanços tecnológicos e as profundas transformações culturais. Imperfeito, porque traduz a nossa melhor visão do presente sobre o futuro e, portanto, é limitado pelo nosso entendimento cognitivo e tecnológico atual. Como diria Peter Drucker, “a melhor forma de prever o futuro é criá-lo”. Nos próximos dias, o SXSW nos dará preciosas ferramentas para continuarmos essa jornada, interminável, de construção.

Publicidade

Compartilhe