Tecnologia e o futuro das conexões humanas
SXSW 2025 aprofunda o debate sobre solidão, saúde social e o impacto da tecnologia nas conexões humanas
SXSW 2025 aprofunda o debate sobre solidão, saúde social e o impacto da tecnologia nas conexões humanas
4 de março de 2025 - 9h42
Se a edição passada do SXSW já indicava uma crescente preocupação com a solidão, o festival de 2025 reforça essa urgência ao eleger o tema como ponto central de sua sessão de abertura. Em 2023, a Organização Mundial da Saúde declarou a solidão como uma epidemia global, e desde então, o impacto das relações digitais e da tecnologia sobre as conexões humanas tem sido amplamente discutido.
No SXSW do ano passado, quatro paineis abordaram o tema diretamente: “Culturally Confronting Loneliness”, “The Paradox of Loneliness and Technology”, “AI and the Future of Loneliness” e “The Power of Belonging: How Ending Loneliness Will Save Our Planet”. Um dos debates foi conduzido por Justin McLeod (fundador e CEO do Hinge) e Ann Shoket (CEO do TheLi.st), que trouxeram dados alarmantes: 83% das pessoas afirmam se sentir sozinhas, especialmente no ambiente de trabalho.
Ann destacou a necessidade de fomentar pequenas ações intencionais para a criação de comunidades, como sua iniciativa “10 minutes of togetherness”, enquanto Justin reforçou o papel das empresas e da tecnologia na criação de espaços de confiança e segurança psicológica. “Esperançosamente, no futuro, veremos mais plataformas de bem-estar social que facilitem conexões genuínas e promovam uma sensação de pertencimento”, afirmou.
A importância das conexões humanas para a sobrevivência e o bem-estar já foi amplamente discutida por especialistas. No livro O Animal Social, o psicólogo social Elliot Aronson explora nossa natureza coletiva e como o pertencimento a um grupo sempre foi fundamental para a evolução da espécie humana. Sua análise menciona o trabalho do antropólogo Robin Dunbar, que desenvolveu a teoria do “número de Dunbar”, sugerindo que o ser humano tem a capacidade de manter cerca de 150 relacionamentos significativos. Segundo Dunbar, comunidades que preservam esse limite tendem a ser mais eficazes e coesas.
Na Opening Session deste ano, o SXSW reforça essa perspectiva ao trazer Kasley Killam como keynote speaker.
Graduada em Saúde Pública pela Harvard T.H. Chan School of Public Health e autora de The Art and Science of Connection, Kasley vem estudando profundamente a relação entre conexão social e longevidade. Seu trabalho evidencia um declínio na saúde social: nos últimos 30 anos, a porcentagem de americanos com dez ou mais amigos próximos caiu 20%; nos últimos 20 anos, o tempo que as pessoas passam sozinhas aumentou em média 24 horas por mês; e, na última década, a participação em comunidades, como clubes de leitura e ligas esportivas, caiu 20%.
Seu alerta é claro: falamos muito sobre saúde física e saúde mental, mas ainda ignoramos um terceiro pilar essencial: o valor das nossas verdadeiras conexões. No contexto atual, em que agentes conversacionais baseados em IA estão se tornando cada vez mais comuns e as relações parassociais se intensificam, a discussão sobre pertencimento e conexão genuína ganha ainda mais relevância.
Mas atenção: não estamos falando sobre uma simples socialização. Kasley reitera a qualidade do vínculo, o suporte mútuo e o autoconhecimento como pilares de uma saúde social efetiva e permanente.
Mais do que um festival de tecnologia e inovação, o SXSW sempre foi um evento sobre interações, pessoas e ideias.
E a mensagem que essa sessão de abertura transmite é clara: mesmo em um mundo cada vez mais individualista e intolerante, nossa essência é coletiva. Dessa forma, temos um importante ponto de partida para as reflexões e discussões da edição 2025.
Nos vemos lá.
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