Um olhar pela janela da saúde no SXSW
Apesar de ter uma trilha específica no evento, várias outras podem apontar caminhos inovadores para um mundo onde a saúde chegue a todos e com equidade
Apesar de ter uma trilha específica no evento, várias outras podem apontar caminhos inovadores para um mundo onde a saúde chegue a todos e com equidade
10 de março de 2025 - 11h39
Quem vai ao SXSW quer estar entre pessoas que estão inovando, procurando entender o presente e vislumbrar o futuro. Com suas centenas de sessões – das apresentações blockbuster àquelas que acontecem nas salas menores –, é como um caleidoscópio no qual procuramos enxergar diferentes facetas do que nos desafia, o que estamos fazendo de novo e onde esse novo pode nos levar. Podemos até nos imaginar como o personagem do livro de H. G. Wells, publicado em 1895, que inventa uma máquina do tempo, viaja nela até o ano 802.700 e encontra uma Terra de felicidade, beleza e paz habitada pelos Eloi. Os avanços tecnológicos e inovações que costumam brilhar nas mais diversas trilhas temáticas do SWSX nos levarão a esse futuro (de preferência bem antes de 802.700)? E será que, como o viajante do tempo de Wells, que encontrou também os malévolos Morlocks, que viviam na escuridão dos subterrâneos, teremos de lidar com construtores de barreiras antiavanços, anticiência e anti-inovação?
Embora com aquele sentimento FOMO (Fear of Missing Out, o medo de estar perdendo alguma coisa importante), típico de quem vai ao SXSW, eu, como médico e presidente do Einstein, procuro vasculhar a programação sob as lentes da saúde. Na trilha específica, teremos uma espécie de “nova temporada” das edições anteriores, explorando biotecnologia, novos avanços da genética, impressão 3D na medicina e o uso recursos digitais, como IA e IA Generativa, em uma diversidade de aplicações – dispositivos médicos, wearables que monitoram nossas condições de saúde, algoritmos que melhoram processos, qualidade e segurança da assistência, ajudam na interpretação de exames e na decisão médica e uma infinidade de novidades que seguem se multiplicando. E aqui um dos aspectos interessantes é a troca: o que está sendo feito em outros países e pode ser usado aqui? Ou o que estamos fazendo aqui que pode ser aplicado em outros locais?
No entanto, passear pelas outras trilhas pode ser igualmente inspirador, porque há uma série de outras temáticas que se conectam direta ou indiretamente com saúde. A trilha de Energia também tem a ver com saúde – seja porque hospitais são grandes consumidores, seja porque as soluções de IA Generativa, que continuarão revolucionando a saúde, dependem dos datacenters alimentados por imensos volumes de energia.
As lentes da saúde também precisam jogar uma lupa sobre a computação quântica, que terá mais ênfase no SXSW deste ano. Essa tecnologia emergente utiliza aspectos da física quântica para resolver problemas complexos com uma rapidez e capacidade de processamento gigantesca. Alphabet e Microsoft já deram uma prévia com o lançamento de seus chips quânticos (Willow e Majorana 1), que teriam potencial para resolver problemas que nem todos os atuais computadores do mundo juntos conseguiriam solucionar. O desenvolvimento ainda precisa avançar muito. Mas, se antes se falava em ter esses recursos disponíveis comercialmente em duas décadas, hoje a promessa é para daqui a alguns anos. A instabilidade da tecnologia é um de seus calcanhares de Aquiles por enquanto. Quando estiver disponível, a computação quântica pode ter uma aplicabilidade muito grande em diversos setores de atividade, inclusive na saúde, com a descoberta de novas moléculas e medicamentos e outras possibilidades, talvez no campo da medicina de precisão, permitindo inferências que hoje não conseguimos fazer. No entanto, na minha visão, a computação que temos hoje já é suficiente para continuarmos a explorar o imenso potencial que as tecnologias digitais nos oferecem para transformar a saúde.
Segurança cibernética e realidade aumentada são outros temas que têm conexão com saúde. Quanto à realidade aumentada, ela já tem aplicações em treinamento de profissionais de saúde, em processos de cirurgia, na radiologia e diagnóstico por imagem, entre outros, e seguirá como um recurso a ser explorado. Blockchain talvez também seja uma temática que em algum momento possa interessar à saúde. Mas creio que no evento o foco serão mesmo as criptomoedas.
Deixei para o final uma outra trilha profundamente conectada com saúde: Clima e Sustentabilidade. Tudo o que se fizer para combater as mudanças climáticas acaba se refletindo na saúde e nos seus determinantes sociais. Mas o fato é que os debates sobre o tema, assim como a busca de soluções, têm focado muito mais a saúde do planeta e seus ecossistemas ambientais do que a saúde de seus habitantes, em especial das populações mais vulneráveis, que são as mais afetadas.
Atualmente, o mundo todo olha com preocupação para os efeitos climáticos sobre a nossa Floresta Amazônica, o desmatamento, as queimadas. Mas quantos desses olhares enxergam as comunidades indígenas e quilombolas que têm visto secarem a níveis recordes os rios dos quais dependem para tudo – seu sustento, sua alimentação, seus deslocamentos, inclusive para chegar a uma unidade de saúde mais próxima? Como ficam essas pessoas frente a condições ambientais e sanitárias que agravam doenças tradicionais da região e ainda trazem novas?
A Amazônia é um exemplo, mas desafios relacionados com clima/saúde/populações vulneráveis não são exclusividade nossa. Ao contrário, eles estão presentes em países mundo afora. Felizmente, aqui, na África e em outros lugares, soluções baseadas em big data, IA Generativa e outros recursos tecnológicos, geralmente desenvolvidas de maneira colaborativa, têm ajudado a enfrentar esses desafios. Por enquanto, são apenas alguns passos na nossa viagem rumo a um futuro onde acesso e equidade em saúde sejam realidade. Mas não há dúvida de que tecnologias inovadoras e replicáveis são combustíveis para acelerar essa jornada.
Com seu emaranhado de sessões e trilhas, seu caleidoscópio de ideias e inovações, além dos encontros e interações que nos propicia, muitas vezes pavimentando novos caminhos de colaboração, o SXSW é um bom lugar onde prospectar e extrair sustentáveis combustíveis de futuro para a humanidade nas mais diversas áreas, a saúde entre elas. Para mim, é um banho de inspiração.
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