Como o jornalismo brasileiro tem reagido ao uso de IA?
Apesar de o jornalismo já utilizar a IA para algumas demandas, mercado vê a tecnologia com cautela
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Amanda Schnaider
2 de janeiro de 2024 - 6h03
“Inteligência artificial generativa (Gen AI) foi o tema que permeou diversos setores da economia em 2023.
Um deles foi o jornalismo. No ano passado, diversos veículos jornalísticos mundiais avançaram no uso da IA generativa a favor do conteúdo e entregas publicitárias.
O Estadão é um desses veículos. O jornal reúne um comitê semanalmente para estudar a inteligência artificial em todos os âmbitos, do editorial ao jurídico.
Além disso, a IA também é usada para simplificar o planejamento de reuniões, entrevistas e grandes projetos do Estadão.
No jornal, os repórteres também usam a tecnologia para a pesquisa e estruturação de reportagens.
No entanto, são proibidos de publicar qualquer conteúdo escrito ou imagem produzida ou modificada por IA.
Além disso, em outubro, o Estadão lançou a Leia, sua própria inteligência artificial.
A Leia é uma espécie de assistente de leitura e guia das informações publicadas pelo veículo.
“A Leia funciona como fonte ágil de respostas para dúvidas que podem surgir ao longo da jornada do leitor”, explica Andre Furlanetto, diretor-executivo de estratégias digitais no Estadão.
Furlanetto revela que a iniciativa veio de demanda percebida nas pesquisas feitas pelo Estadão. “Parte importante da audiência necessita de melhor contextualização dos fatos para absorver integralmente um conteúdo”, complementa.
O executivo reforça que um canal de informação com o impacto da Leia aumenta o valor da marca para os assinantes e se apresenta como diferencial na atração de novos assinantes.
Assim como o Estadão, não é de hoje que o jornal O Globo utiliza inteligência artificial no dia a dia. Há alguns anos, o veículo já utilizava links de recomendação em seu site escolhidos por IA a partir do hábito do usuário.
“O que estamos discutindo agora é a melhor forma de utilizar a IA generativa.
E incentivamos nossos repórteres a experimentar a tecnologia de uma forma que ajude o dia a dia do trabalho”, ressalta André Miranda, editor-executivo de O Globo.
Contudo, a publicação de conteúdo produzido por IA generativa sem que haja alguma razão específica para isso não é aceita pelo veículo. “Por exemplo, já usamos fotos geradas por IA em matérias sobre IA, mas deixando isso bem claro para o leitor”, salienta o editor-executivo.
No entanto, o uso de IA é diferente de veículo para veículo.
O BuzzFeed, por exemplo, usa IA para personalizar e tornar mais interativos os quizzes e chatbots, além de criar imagens.
O time comercial do veículo utiliza ferramentas de IA para encontrar conteúdo que corresponda melhor às propostas dos anunciantes.
Isso tornou a negociação bem mais rápida.
No entanto, a nova “ferramenta” apresentou uma série de riscos ao jornalismo, como o fomento à desinformação, quebra de direitos autorais e falta de remuneração por conteúdo jornalístico.
Nesse sentido, estima-se que modelos de IA tenham internalizado conteúdo de cerca de 15 milhões de portais, sem autorização legal prévia, remuneração ou reconhecimento de direitos autorais, segundo a Associação Nacional de Jornais (ANJ).
Desses 15 milhões, um terço é formado por empresas e organizações, outro terço por conteúdo acadêmico e o terço restante pela imprensa.
Com isso, para tentar frear esse movimento, em setembro, empresas de jornalismo e do mercado editorial se uniram para lançar os “Princípios Globais para a Inteligência Artificial”,.
O documento é inédito para o uso de IA no mercado criativo.
Ao mesmo tempo em que pretende impulsionar e criar oportunidades de negócios para esse mercado, o documento quer fomentar o desenvolvimento da tecnologia de forma responsável, sustentável e ética.
O texto conta com 26 signatários no mundo, incluindo a ANJ, que tem O Estadão, O Globo, Valor Econômico, Zero Hora e outros veículos entre os associados.
“É essencial que nossos legisladores acompanhem bem de perto o desenvolvimento dessas ferramentas e criem regras de regulação para remunerar os produtores de conteúdo e para garantir a transparência das plataformas”, pontua Miranda, de O Globo.
O editor-executivo salienta ainda que a IA generativa impactará a produção jornalística e a distribuição de conteúdo.
“Não tenho dúvida de que, em poucos anos, teremos modelos de linguagem treinados a partir de conteúdos confiáveis e que gerem respostas bem melhores do que temos hoje. Os jornais enfrentarão um dilema sobre usar ou não conteúdo escrito por máquinas”, afirma.
Nesse sentido, nos últimos meses, o Estadão implementou uma política de IA, que é de conhecimento de toda a organização, de manter total transparência para com o usuário.
A Leia está se expandindo para um “modo jornalista”, que auxilia a redação em traduções e sínteses de documentos e investigações.
“E isso precisa ficar bem claro para nossos leitores”, afirma.
“Há inúmeros testes em curso na redação e ainda nas áreas de publicidade e produtos, que vão ficar visíveis para a audiência este ano”, completa Furlanetto.
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