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Desigualdade no câncer de mama

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Opinião

Desigualdade no câncer de mama

Como o Outubro Rosa pode atuar pela equidade no diagnóstico?


29 de outubro de 2024 - 12h59

O Outubro Rosa está se encerrando e durante o mês todo estivemos cercadas de comunicações e ações que reforçaram importância do diagnóstico precoce, do autoconhecimento das mamas, das consultas e exames de rotina para garantir que o maior número de pessoas possível receba seus diagnósticos e acessem seus tratamentos. Mas, será que as campanhas estão de fato transmitindo a mensagem como deveriam e garantindo que as mulheres recebam as mensagens da melhor forma possível?

Essa é uma reflexão importante a ser feita o ano inteiro, principalmente antes de preparar essas iniciativas. Não me refiro às ações que têm exclusivamente como interesse surfar o movimento, tão importante que a cada ano que passa conquista mais e mais espaço, mas sim às ações e comunicações fundamentadas em conteúdos sérios e com objetivos claros de levar informação de qualidade para podermos quebrar tabus e levar as mulheres à realização de exames.

Os dados do Panorama do Câncer de mama, estudo realizado pelo Instituto Avon em parceria com o Observatório de Oncologia da Abrale com base nos dados do DATASUS, mostram que, finalmente, em 2023 o volume de exames realizados para rastreamento (aqueles exames realizados quando a mulher não tem nenhum sintoma, os conhecidos exames de rotina) aumentaram 5,7% em relação a 2019 – ano de referência antes da pandemia causar um impacto importante na queda da realização desses exames. Só em comparação a 2022, o aumento foi de 4,2%.

Esses números poderiam ser motivo de celebração, de uma percepção de que finalmente estamos conseguindo retornar ao normal no cuidado com a saúde das mamas das nossas mulheres. Mas, os dados trazem complementos que nos chamam a atenção e nos fazem voltar à pergunta sobre: estamos comunicando e cuidando das mulheres como deveríamos? A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para cobertura mamográfica é de 70%, mesmo com o aumento da realização dos exames, nós ainda não ultrapassamos os dados de 2019, que era de 24,5%; apenas conseguimos nos aproximar em 2023, chegando a 24,4%. Ou seja, mesmo considerando a população em geral, ainda estamos muito distantes de cuidar de nossas mulheres como deveríamos para garantir o diagnóstico precoce.

Então, se observarmos a diversidade étnico-racial, esse descuido se mostra ainda maior – 47,9% dos exames de mamografia de rastreamento em 2023 foram realizados em mulheres brancas, contra 40,4% de exames realizados em mulheres negras. Ao observarmos os dados do último Censo em relação à população, nós vemos que as mulheres negras representam 57,9% do total de mulheres em nosso País, ou seja, estamos muito distantes de cuidar de forma igualitária das mulheres, mesmo quando estamos falando de exames de rastreamento, de exames que atendem a mulher ainda não necessariamente doente.

Seria absolutamente irresponsável responsabilizar exclusivamente as campanhas de conscientização por tanta diferença entre a população de mulheres negras no país e seu acesso aos exames de rastreamento. Sabemos que existem diversas questões sociais, falhas no sistema que não consegue garantir esse acesso igualitário e no próprio modelo de atendimento que não consegue cuidar de forma dedicada às questões étnico raciais, mas precisamos também considerar a importância da representatividade quando estamos observando campanhas de conscientização.

Ao pesquisar rapidamente em imagens de campanhas do Outubro Rosa, podemos ver a baixa representatividade de mulheres negras nas comunicações e isso é extremamente importante ao considerar a mensagem que a falta de representação passa para as pessoas impactadas por essas comunicações. Precisamos revisar nossa forma de escolher as representantes das comunicações, as mensagens que passamos e pensar em meios de falar com todas as mulheres de transmitir a mensagem. Também é necessário garantir que os direitos sejam reconhecidos e reforçados. Isto porque, as mulheres só conseguirão acessar seus cuidados com a saúde de rotina quando tomarem consciência que mais que um cuidado individual, isso é um direito de todas nós.

É primordial um esforço contínuo, embasado e cuidadoso para garantirmos que as comunicações sobre a saúde das mamas, os direitos, os caminhos para acesso possam chegar às mulheres para transformar sua relação com o cuidado com a saúde das mamas. Assim como é fundamental que as políticas de saúde também olhem para a equidade étnico-racial com cuidado e responsabilidade para que, nos próximos estudos, possamos observar coerência entre a população e o atendimento dedicado às nossas mulheres.

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