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Transformação e desafios: qual o futuro das revistas?

Executivos da editora Abril e revistas Pais&Filhos e Caras relatam sua visão e atitudes diante às quedas de circulação, aceleração digital e novos formatos


3 de dezembro de 2021 - 7h58

(Crédito: Denise Tadei/Meio & Mensagem)

Mesmo com a adaptação dos títulos e das publicações para o ambiente digital, o questionamento de um possível “fim” de alguns formatos, como as revistas, ainda é levantado por algumas pessoas. As opiniões encontram base em estatísticas como os dados do Índice Verificador de Comunicação (IVC), que identificaram uma queda de circulação tanto nas edições impressas (38,9%) quanto nas digitais (de 24,7%) em 2020.

Esses números menores podem ser explicados pelo novo comportamento do leitor e pela maior oferta de informações, na opinião de Fernando Moraes, doutor em Ciências da Comunicação e professor de jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie.  Acredito que esse recuo, tanto no impresso quanto no digital, é reflexo do ambiente atual em que a informação circula de forma rápida e superficial. As pessoas estão perdendo o hábito de aprofundar a leitura. O desafio atual é resgatar o saudável hábito da leitura, com publicações interessantes e segmentadas”, comenta.

Apesar desse cenário, os executivos do segmento de revistas, quando questionados sobre o futuro das publicações, se mostram esperançosos em relação à diversificação de vertentes do negócio. Mas então, como o modelo está se reinventando?

“Especialização e tradição geram confiança e a confiança na informação que se consome é o grande produto de luxo do mundo da comunicação digital. Postar é fácil, qualquer um faz. Mas divulgar um fato, e ter esse fato recebido com credibilidade, é um ativo para poucos. É algo que precisa de nutrição e investimento constante, mas é um ativo extremamente valioso. A boa e velha credibilidade jornalística é o ativo mais valioso no mundo da comunicação digital.  O resto é ferramenta e suor”, acredita Fabio Carvalho, CEO do Grupo Abril.

O executivo conta que o cenário atual não é mais de adaptação, e sim de transformação completa para um modelo no qual o meio primário de divulgação de todo o conteúdo produzido pela Abril passou a ser o digital. Neste contexto, o impresso se torna um produto complementar, mas que, ainda assim, tem seu espaço e valores únicos e especiais.

“Cada vez mais acreditamos em atender ao interesse do leitor em múltiplos formatos. Já podemos dizer que o digital se tornou preponderante no esforço operacional e jornalístico do dia a dia. De toda forma, é importante sublinhar que a revista impressa, ao contrário do esperado, manteve uma grande parcela de importância e se firma cada vez mais no nicho que passou a ocupar. Cada vez mais acreditamos em atender ao interesse do leitor em múltiplos formatos”, discorre Carvalho.

Adriana Cury, diretora geral da Pais&Filhos, também diz que a revista está em constante movimentação e que mesmo com a presença no digital, o material físico não perderá o seu valor. Ela comenta que o impresso continua tendo importância para a marca, principalmente no segmento em que atuam, pelo fato de as mães, público-alvo do título, gostarem de compartilhar as edições.

“Esse questionamento sobre o futuro das revistas no Brasil já é antigo. Acho que vai continuar como é hoje e não acredito que irão acabar. A revista vai se transformar. Pode ser até que, no futuro, ela não esteja no papel, mas não significa que não vai existir. O conteúdo de credibilidade do meio é algo importante e uma grande prova disso é que, muitas vezes, quando uma assessoria busca uma matéria que publicamos no site, por exemplo, ela nos pergunta em qual edição impressa a matéria sairá. As pessoas ainda têm esse prazer de ver concretizado em algo palpável”, pontua.

Carvalho explica que o desafio enfrentando pelas revistas impressas é de escala. O CEO do grupo Abril afirma que para editoras de menor porte, as contas são difíceis de fechar. E fatores como a disparada do dólar e o aumento de preços de energia e do combustível só pioraram a situação. Porém, de acordo com ele, se existir escala e importância, ainda há um bom negócio, já que a revista impressa é um produto premium, que permite ao leitor usufruir do conteúdo sem obrigação de olhar para uma tela. Para ele, proporcionar uma atividade interessante e prazerosa fora da tela, nos dias atuais, é uma vantagem importante. Além disso, o executivo cita estudos que indicaram que a leitura nos meios impressos permitem maior absorção da informação.

“Basta perguntar para qualquer um que passou os últimos dois anos pulando de Zoom para Google Meet e para Teams, dedicando oito, dez, 12 horas por dia olhando telas, a respeito do prazer e do alívio de poder ler um impresso de qualidade. Sem falar na ausência de notificações e outras interrupções e na qualidade do material fotográfico em papel — em comparação com uma pequena tela de celular. Para os anunciantes há também uma experiência diferente, uma página dupla em uma revista tem um impacto visual e um poder de capturar a atenção do leitor incomparavelmente maior do que um banner à margem de uma tela”, opina Carvalho.

O executivo complementa que, mesmo as revistas escolham migrar 100% para o digital, encontram na sua especialização e tradição uma grande fortaleza para a competição nesse ambiente. Por natureza, afirma, são veículos de comunicação especializados em determinadas verticais de informação e conhecimento e essa segmentação ajuda a encontrar seu espaço no digital, onde é essencial se destacar para sobreviver.

 

Segundo o IVC, publicações tiveram, em média, queda na circulação impressa (38,9%) e também na digital (de 24,7%) em 2020 (Crédito: Denise Tadei/Meio & Mensagem)

Pensamento multiplataforma
Luciana Romano, diretora de circulação da editora Caras, conta que todos os produtos e projetos atuais da revista são pensados de maneira 360º, incluindo os eventos, que são parte importante da estratégia de marca e receita. “As adaptações são necessárias para acompanhar a mudança de vida das pessoas, suas necessidades, seu tempo disponível e onde elas estão. As pessoas não deixaram de ler, procurar informação e conteúdo. Só mudaram os locais onde procuram isso e é lá que temos de estar, como marcas de confiança e credibilidade”, comenta.

A diretora revela que a editora ampliou sua entrega de conteúdo desde a disponibilização da revista em um ambiente digital até o desenvolvimento de novos conteúdos adaptados ao formato de entrega, como TikTok e Kwai. “Acredito que sejam oportunidades de novas entregas e produtos do que dificuldades,  já que o digital permite medir com eficiência o resultado de cada ação. A comunidade é muito participativa e nos dá rapidamente a resposta se estamos ou não indo no caminho certo”, reforça.

Para Adriana, da Pais & Filhos, inovar e testar as tecnologias serão os caminhos para as editoras, pois as oportunidades surgem todos os dias e, por isso, é preciso sempre estar antenado nas novas tecnologias e plataformas. Ela diz que a publicação, já há tempos disponível em versão para tablet, recentemente foi lançada para a Alexa, inteligência artifical da Amazon e que, em breve, terá um podcast.  “O questionamento da importância da transformação digital é quase uma pergunta do passado: quem não se transformou está fadado a morte. É importantíssimo que as pessoas e as empresas se transformem, que os funcionários sejam treinados para isso e que as instituições de ensino formem os profissionais já para esse novo formato no mercado de trabalho”, conclui.

Transformando a estrutura
Para acompanhar todas essas mudanças, Carvalho conta que a editora Abril irá completar uma revisão de 100% dos códigos de todas as plataformas digitais em que o leitor interage ao longo de 2022, buscando trazer uma experiência de primeira linha e de acordo com as métricas e técnicas internacionais. E, até o final do próximo ano, a empresa terá completado também a transformação dos sistemas transacionais que geram assinaturas, atendimento, e atividades correlatas. Ainda em 2022, mas também parcialmente em 2023, será a vez dos sistemas de back-office.

“De forma geral, a cultura da companhia já está no lugar correto do ponto de vista da digitalização. O que estamos atingindo, passo a passo, é a disponibilização das ferramentas de vanguarda que ambicionamos. Mesmo tendo que rever toda a forma de trabalho e enfrentando todas as dificuldades que nós, e o mundo todo, tivemos que enfrentar, estamos tecnologicamente à frente do que imaginávamos nesse momento. Isso é motivo de muito orgulho. Mas a dinâmica do digital é tal que, hoje, estou convencido de que não se termina nunca um processo de transformação. O que pode ser ambicionado é chegar no mesmo ponto de transformação que os líderes internacionais estão — e então prosseguir com uma transformação perpétua com os demais players da indústria no mesmo nível de maturidade. Basta lembrar que ainda vem o metaverso pela frente”, considera o CEO do grupo Abril.

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